Enquanto juntava material para o meu próximo post, o blog recebeu uma mensagem de uma leitora em apuros com uma dúvida muito comum: quais as diferenças, na prática, entre o estilo Barroco e o estilo Clássico? Por que a Primavera de Vivaldi é considerada barroca e a Sinfonia 25 de Mozart, clássica? Foi aí que separei uns 40 minutos do meu tempo e montei rapidamente a resposta abaixo. Porém minha supresa depois foi grande, quando recebi vários elogios e agradecimentos não só da leitora mas também dos colegas de blog. Então, enquanto meu próximo post não fica pronto, resolvi compartilhar com vocês o texto tão elogiado.
Mas vou logo avisando: este post está dedicado aos ouvintes que TEM esta dúvida, e por isso ele está cheio de dicotomias e generalizações para que os ouvintes COMECEM a enxergar as diferenças. Tenho certeza que para cada exemplo que eu der, aparecerá alguém oferecendo um contraexemplo: mas a obra X é barroca e não tem essa característica. Sim, é claro, mas para justificar isso entraríamos em uma seara especializada que o ouvinte iniciante ainda não está preparado para enfrentar. Para estes ouvintes mais dedicados, peço um pouco mais de paciência pois ainda iremos dedicar posts e mais posts sobre o assunto. Aguardem!
As definições e teorias são fáceis de entender; quem quiser saber mais, leia aqui sobre o estilo barroco, e aqui sobre o neoclassicismo (que na música é chamado apenas de classicismo). Mas, e quando colocamos o CD para tocar, o que devemos observar para identificar os estilos?
O Barroco é detalhista…
Em resumo, o Barroco é aquela arte cheia de detalhes, cores fortes, uma enorme religiosidade e um grande contraste entre o sagrado e o profano. Então repare a quantidade de detalhes nessa estátua da Alemanha…
… e depois ouça o início do Concerto de Brandeburgo n.2 em Fá Maior de Bach:
[kad_youtube url=”http://www.youtube.com/watch?v=gNXaJKdr7yk” maxwidth=”600″]Repare a quantidade de informações presentes na música: é muita gente tocando coisas diferentes (e interessantes!) ao mesmo tempo. Até mesmo quando o violino toca sozinho, tem um baixo comentando algo diferente no fundo. Aliás a melodia que o baixo toca é apaixonante e nada monótona, com muitos saltos e frases rápidas cheias de notas diferentes. Veja como a música está sempre trocando de instrumentos, e a mesma melodia passa de um instrumento para outro com muita facilidade.
… e o Clássico é racional
Vamos para o Clássico então. Aqui surge a influência do Iluminismo, aquela corrente de pensamento mais racional e matemática e menos religiosa. Há uma forte sensação de ordem em tudo, todas as coisas precisam estar nos seus devidos lugares. Isto se reflete nas artes plásticas por uma procura pelo geometrismo e pela simetria, como nesta pintura do Goya:
Tem uma folha no chão; se ela fosse barroca, ela estaria cheia de curvas, rebarbas e detalhes. Olhe o bosque no fundo, todo borrado: onde estão as folhas das árvores? Mas o que é mais importante no quadro está em grande destaque, é a senhorita à frente, seu sorriso e seu cachorro; o restante não tem tanta importância. E a sombrinha verde está na mesma direção do muro, compondo uma simetria com a árvore vergada pelo vento. Agora ouça o início do Divertimento K.136 de Mozart:
[audio:http://euterpe.blog.br/wp-content/uploads/2012/05/DivertimentoK136-1.mp3|titles=Mozart: Divertimento em Ré Maior K.136 – 1. Allegro (Kurpfälzisches Kammerorchester Mannheim – Florian Heyerick)]A melodia tem todo o destaque, o resto não tem importância alguma. Tente cantar junto a linha dos baixos, e você irá notar que ela tem uma nota só, a mesma nota repetida muitas vezes e só de quando em quando muda. Quando aparece uma viola para cantar algo diferente, que nada, ela também fica repetindo sempre a mesma nota. O classicismo passa essa impressão de “simplicidade”, o que não significa que ele seja mais simples que o barroco. Sua complexidade reside na estrutura da obra, a forma que dá ordem à música e põe as melodias nos seus devidos lugares. Quem quiser mais informações pode consultar nosso post sobre forma-sonata (que é a forma do divertimento logo acima) e o tema com variações.
O Barroco é cheio de ornamentos…
A foto ao lado é de uma porta no palácio de Peterhof, em São Petersburgo, Rússia, ricamente adornada em estilo barroco. Parecem folhas de um jardim, não? E quanto mais se chega perto, mais detalhes saltam aos olhos: além de folhas nós vemos pássaros, conchas e um busto lá em cima. Agora ouça a Ária que abre as Variações Goldberg de Bach:
[audio:http://euterpe.blog.br/wp-content/uploads/2012/05/Aria-Goldberg.mp3|titles=Bach: Aria das Variações Goldberg BWV.988 (Murray Perahia)]É uma música lenta, mas repare como tanto a melodia quanto o baixo são cheios de ornamentos – e por ornamentos entenda, são aquelas notinhas “extras” de enfeite, um trinado aqui (laiaiaiaiai), um mordente acolá (pariram, tirarim), algumas apogiaturas (piram, tarim), etc. A melodia nunca é “lisa”; se pudéssemos desenhá-la, ela teria tantas curvas quanto a porta da foto ao lado.
… e o Clássico é enxuto
Contrastando com o barroco, no clássico encontramos apenas o “essencial”, simples e direto, sem tantos fru-frus. Por exemplo, ouça esse Concerto para Piano de Mozart (um trecho do famoso Concerto n.21 K.467 em Dó Maior):
[audio:http://euterpe.blog.br/wp-content/uploads/2012/05/ElviraMadigan.mp3|titles=Mozart: Concerto para Piano e Orquestra n.21 K.467 – 2. Andante (Maria Joao Pires – Claudio Abbado)]E repare como as melodias são lisas e sem rebuscamento, e o acompanhamento sempre muito simples: um-pa-pa-pa-pa-pa um-pa-pa-pa-pa-pa…
O Barroco é contrastante…
A arte barroca também é uma arte de contrastes binários: o escuro e o claro, Deus e o homem, o sacro e o profano. O que você vê nessa pintura de Vermeer?
Eu vejo sombras e luz; uma mulher e um homem; alguém de frente e outro de costas; uma janela e um mapa (duas visões do mundo). Agora ouça o terceiro movimento do concerto O Outono de Vivaldi:
[audio:http://euterpe.blog.br/wp-content/uploads/2012/05/LaCaccia.mp3|titles=Vivaldi: Concerto para violino, cordas e continuo “O Outono” – 3. Allegro (Lorin Maazel)]Você ouve: forte e fraco (não tem meio termo); ou toda a orquestra ou só o violino solo (não tem meio termo); ou lento ou rápido. Não tem trechos com o ritmo acelerando ou volume crescendo – ou pelo menos, não há nada escrito sobre isso na partitura. Se você ouvir qualquer gravação barroca com crescendos e acelerandos, saiba que isto é uma liberdade do músico executante (liberdade esta bem aceita hoje em dia).
…e o Clássico é simétrico
A foto ao lado é da fachada da casa de chá (Belvedere significa mirante) do jardim do palácio de Charlottenburg, em Berlim, Alemanha. Observe que um lado é exatamente igual ao outro; é quase tudo muito reto, sem todas aquelas folhas e contornos complexos do barroco. Em cada andar há exatamente duas janelas de um lado, duas janelas do outro. No centro, primeiro andar, há duas colunas de um lado, duas do outro. Lá em cima, um triângulo marcando o centro. A entrada é simples e funcional.
Vamos dar uma olhada no início da Sonata para Violoncelo e Piano n.3 em Lá Maior de Beethoven:
[audio:http://euterpe.blog.br/wp-content/uploads/2012/05/CelloSonata31-1.mp3|titles=Beethoven: Sonata para Violoncelo e Piano n.3 em La Maior – 1. tema 1 (Du Pre – Kovacevich)]Como num jogral, o violoncelo começa o primeiro tema, e o piano termina.
[audio:http://euterpe.blog.br/wp-content/uploads/2012/05/CelloSonata31-2.mp3|titles=Beethoven: Sonata para Violoncelo e Piano n.3 em La Maior – 2. repete tema 1 (Du Pre – Kovacevich)]Então piano toca o que o violoncelo tocou antes, e violoncelo responde o que o piano respondeu antes (só trocaram os papéis, seguindo uma simetria).
[audio:http://euterpe.blog.br/wp-content/uploads/2012/05/CelloSonata31-3.mp3|titles=Beethoven: Sonata para Violoncelo e Piano n.3 em La Maior – 3. transição (Du Pre – Kovacevich)]Em seguida ouvimos uma transição, e repare que quase sempre os trechos se repetem, como se viessem em pares. A transição leva ao segundo tema:
[audio:http://euterpe.blog.br/wp-content/uploads/2012/05/CelloSonata31-4.mp3|titles=Beethoven: Sonata para Violoncelo e Piano n.3 em La Maior – 4. tema 2 (Du Pre – Kovacevich)]Tal como se estivéssemos do outro lado do espelho, agora é o piano quem começa o tema, e o violoncelo quem o termina (exatamente o contrário do primeiro tema).
[audio:http://euterpe.blog.br/wp-content/uploads/2012/05/CelloSonata31-5.mp3|titles=Beethoven: Sonata para Violoncelo e Piano n.3 em La Maior – 5. repete tema 2 (Du Pre – Kovacevich)]E na repetição do segundo tema, o violoncelo toca o que o piano tocou antes, e o piano conclui o que o violoncelo concluiu antes. A sonata continua ainda com páginas e páginas desse revezamento.
Vamos praticar?
Comecei o texto perguntando: por que a Primavera de Vivaldi é barroca e a Sinfonia 25 de Mozart é clássica. Vamos aplicar os conhecimentos primeiro em Vivaldi:
[audio:http://euterpe.blog.br/wp-content/uploads/2012/05/Primavera.mp3|titles=Vivaldi: Concerto A Primavera – 1. Allegro (Lorin Maazel – Solistas da Orq. Nacional da França)]Tente reparar em tudo o que eu falei anteriormente. A quantidade em excesso de informações, onde cada instrumento toca algo diferente e interessante, porém com uma observação importante: Vivaldi aqui queria passar a impressão da simplicidade da vida no campo, então talvez esse quesito “excesso de informações” fique um tanto mascarado. Porém as outras caracteristicas estão presentes: a alternância de contrastes entre fraco e forte, entre toda a orquestra e apenas os solistas. Note também a riqueza de ornamentos, os trinados, as melodias que não são lisas. Aos mais interessados, recomendo a análise que escrevi aqui em Euterpe de todas as Quatro Estações.
E agora o Mozart:
[audio:http://euterpe.blog.br/wp-content/uploads/2012/05/Sinfonia25.mp3|titles=Mozart: Sinfonia n.25 em Sol menor K.183 – 1. Allegro con brio (Jaap ter Linden)]Só há uma melodia tocando por vez, não temos vários instrumentos se atropelando e tocando coisas diferentes ao mesmo tempo. Quando tem, é só um acompanhamento: ou os sopros tocam notas longas (a mesma nota, bem longa), ou são notas repetidas (a mesma nota, repetida). Tente achar a passagem mais complicada, e ainda assim ela será mais simples e clara do que em uma obra barroca.
A habilidade de diferenciar o clássico do barroco vem, principalmente, da prática. E “prática” aqui, estamos falando em… ouvir! Quanto mais você ouve um estilo de música, mais fácil será para identificá-lo depois. Assim eu não poderia finalizar este texto sem deixar esta recomendação: ouçam bastante música!
ADOREI as colocações e as comparações com a pintura e a arquitetura. Tudo muito bem escolhido e posto para ser entendido por um grupo de ouvintes que curte música clássica, mas não necessariamente tem conhecimento para encarar um texto cheio de detalhes de teoria musical. Parabéns. Já estou compartilhando.
Maravilha de aula !!!! Por isso amo a internet: ela me fez descobrir o mundo da música que conheço pouco, mas que me fascinava desde adolescente quando li , entendendo pouco, o livro de Otto Maria Carpeaux. Sou de familia de origem italiana, os colonos que vieram nos finais do seculo XIX para o Rio Grande do Sul, mais precisamente Bento Goncalves. Meu pai nasceu em Bento Goncalves e amava ouvir ópera e alguns “clássicos”. Portanto tenho familiaridade com a música erudita de uma maneira simples, por isso estou adorando este blog, ainda que seja em algumas ocasiões de difícil entendimento para quem não teve educação musical.
muito bom.
Interessante suas colocações, só para acrescentar minhas próprias impressões sobre como eu sinto essas diferenças.
O velho Harnoncourt dizia que o barroco é falado e o classíco é pintado.
Isso me ajudou demais a sentir as relações de fraseado, harmonia e acompanhamento dos dois estilos. Enquanto no barroco todo o fraseado ainda é construído tendo a voz humana como referência e no classicismo os instrumentos ganham mais autonomia, com outros tipos de fraseado recursos expressivos e mesmo e respirações.
O detalhismo do barroco, as ornamentações e o cânone “claro escuro” não sinto muito determinantes, tirando o barroco francês de Luly no caso da ornamentação…penso que em Mozart os ornamentos e datalhes são muito presentes, bem como os contrastes de dinâmica. Estou pensando por exemplo nos divertimentos …ou mesmo nos quartetos.
No fundo acho muito desses adjetivos vem da tentativa de aproximar o barroco em música com o barroco da literatura ou das artes plásticas…nem sempre da certo.
Como não dizer que um Bach não é racional ou simétrico, (tá eu sei Bach é Bach, e é barroco tardio), ou que um Haydn ou Mozart não são cheios de ornamentos?
O classicismo representa sim a cristalização de um tipo pensamento…mas acho que o ponto não é a simetria mas é uma espécie de elegância. É contido, é claro, preciso e não exagera. Enquanto no barroco ainda são os instrumentos fazendo as vezes de vozes, seja em solo ou em contraponto. No classicismo a trama é outra, se é pra comparar com outras áreas que seja com a dimensão harmônica adquirindo outro tipo de função ou a forma sonata atuando como um cenário ou antes uma moldura para a pintura dentro dela.
Depois quero comentar algumas questões que surgem a partir desse tema, mas por enquanto comento as descritas acima.
magno,
Sobre o contraste, creio que o Amancio se referia a algo como o começo da Sinfonia Concertante para Violino e Viola de Mozart, como nesse longo crescendo de 1’32” a 1’55”: http://www.youtube.com/watch?v=aT3Z11472gw, e como isso ou nunca era explorado pelo barroco ou pelo menos nunca era anotado dessa maneira. E creio que isso, o desempenho dos contrastes dentro de uma MESMA música, seja mesmo um dado distinguível. Alguns fatores técnicos também influenciam isto, como a manutenção da afinação dos instrumentos e como as condições até o barroco moldaram a noção de unidade de uma mesma peça. Mas isso fica pra outra oportunidade ou post.
Sobre a melodia lisa ou enfeitada, creio que esses “ornamentos” de Haydn e Mozart possam ser descritos mais como “coloratura”: há uma virtuosidade incorporada à melodia clássica, muito bem representada, por exemplo, pela técnica das chamadas “variações melódicas”, sempre exploradas nos seus conjuntos de variações. Mas me parece que essa coloratura da melodia clássica não se confunde com o verdadeiro tratado de ornamentações contido nas Variações Goldberg, em que o enfeite surge de maneira muito menos econômica, até porque tem funções importantes, como o de sustentar as vozes em um instrumento como o cravo ou de “encher” o volume de uma delas em comparação às outras na falta de um mecanismo de dinâmica do instrumento. Então dá pra comparar esta sonata do Scarlatti (K. 253): http://www.youtube.com/watch?v=wgfD1NeVXu4 e a função dos ornamentos nela com algo como o terceiro movimento da Sonata No. 17 K. 570 de Mozart: http://www.youtube.com/watch?v=PQWqJylowGk, em que há ornamentos, mas que não assumem função tão central quanto as mudanças rítmicas e de textura bem constantes e a tal coloratura.
Não à toa, quando Beethoven começa a usar longuíssimos trinados nas suas últimas sonatas isso é entendido como uma reabilitação da ornamentação na música que deve algo à música barroca.
E sobre a forma, creio que no classicismo, pra dar conta de certas atitudes musicais mais repentinas e mais sutis do que “chiaroscuras”, ela teve que se sofisticar, pra música não perder a sua noção de unidade. Isso vale tanto para as mudanças mais remotas de tonalidade como as mudanças temáticas, e aí uma certa simetria de fato trabalha para organizar as coisas, mesmo com o ritornello sendo usado de maneira mais estratégica para o efeito do conhecimento do público desta ou daquela seção, etc.
Mas também penso em muitas coisas quando vejo essa caracterização geral, e é difícil conter os passos seguintes a que ela convida.
Que maravilha podermos matar a ignorãncia!
Amei!
Obrigada!
Que lindo post! Posso traduzi-lo no meu blog? E haverá um outro sobre as diferenças entre o estilo Clássico e o estilo Romántico?
Até logo e obrigado :)
Mario Kraus
Mário, fique à vontade para traduzir. Só não esqueça de adicionar um link para o original, aqui.
Diferenciar o barroco do clássico tem lá suas dificuldades porém a maioria das diferenças envolvem critérios objetivos. Mas no estilo romântico entramos no domínio do subjetivo, o herói romântico, a visão pessoal do artista em detrimento das regras acadêmicas: como transformar isso em critérios objetivos? Aliás, será que isso é possível?
A transição do barroco ao classicismo em alguns pontos é até mais escamoteada do que a do classicismo ao romantismo, acho que dá pra fazer alguma coisa tomando essas referências ideológicas mais como apoio e concentrando-se na prática mais distinguível. O maior problema pode ser o fato do classicismo ser justamente o período paradigmático da música, e por isso dominar vários princípios que ainda compõem a técnica de como fazer música no século XIX. Mas é outra conversa muito interessante.
Esse post foi muuuito legal e interessante, agora vou passar a ouvir ainda mais musicas, para também, poder identificar se estão no barroco ou clássico….. :)
Nossa, essa informação é de grande valia……parabéns ao Euterpe, é difiil encontrar informações assim hoje m dia…… :)
Prezado professor,
Parabéns pelo blog. Haveria alguma distinção entre o barroco e o rococó na música, assim como há nas artes plásticas e arquitetura?
Obrigado.
Antes de mais nada, obrigado pelo “professor”. (Pelas simplificações do artigo acima, estou mais para caolho em terra de cego)…
O rococó é uma transição do barroco para o clássico, e assim as diferenças são bem mais sutis, tanto olhando para um lado quanto para o outro. Em termos gerais, as linhas melódicas do rococó são mais simples que as do barroco, o baixo deixa de ser tão movimentado, e as formas são mais marcantes e destacadas (porém não tão complexas quanto as formas clássicas). Uma audição atenta comparando o velho Bach e seus filhos pode trazer essas e outras diferenças à tona. Tartini e Boccherini também possuem várias obras em estilo rococó; particularmente eu adoro esse concerto para violoncelo (ou viola da gamba) em Lá Maior do Tartini:
http://www.youtube.com/watch?v=GjVTfXNis1o
Onde dá pra perceber essa mistura de elementos do barroco e do clássico, que faz a obra não ser nem uma coisa nem outra.
Notem que se o barroco e o classicismo forem períodos musicais, o rococó estaria mais pra um estilo situado na sua transição, mas já dentro do classicismo. Então o post também abrange algo do rococó ao falar do classicismo.
Muito bom e esclarecedor!
Obrigado, sigo acompanhando!
Navegando por aí, encontrei uma análise muito interessante do quadro do Goya citado no post, “O Guarda-Sol”:
http://es.wikipedia.org/wiki/El_quitasol
Está em espanhol, mas é fácil entender. O ponto alto da visita está na figura mostrando as simetrias do quadro, esta aqui: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:El_Quitasol_lineas.jpg
Eu simplicaria assim: como diferenciar musica barroca de classica? Simples. Se voce ouvir um cravo acompanhado de um baixo ao fundo, é barroco. Se nao tiver a dupla cravo/baixo, nao é barroco.
Denison,
Acho que seria um conhecimento meio enganoso e superficial, que não ajudaria a entender a diferença da linguagem musical dos dois períodos senão se apegando a um aspecto quase acidental, que por si só também não estaria sendo justificado. Além disso, seria a busca meio surda por uma única pista que diria respeito apenas a reconhecer a música do barroco ou não, diferente de um entendimento histórico da transição do barroco para o classicismo.
Mas mesmo que o objetivo não fosse entender, mas apenas “matar charada”, daria errado em casos como música para solistas – como teclado, órgão, violino, cello, viola da gamba, alaúde, flauta -, algumas formas de música de câmara – como a de Biber e suas sonatas pra pequenos grupos -, alguns madrigais a capella, oratórios e música sacra em que o órgão é que faz baixo contínuo, etc. Depois, por exemplo, algumas obras clássicas com baixo contínuo com cravo e cello, como as sinfonias de C. P. E. Bach, também trairiam esse critério. E, finalmente, releituras do barroco e a reabilitação do cravo, como a música escrita para o instrumento no século XX por Poulenc, Falla, Ligeti, Xenakis, etc. Além disso, claro, há gravações da música barroca mais antigas que substituíam o cravo pelo piano, como o Furtwängler.
Excelente post, simples, direto ao ponto, totalmente didático! Também adorei os exemplos usados nos campos da pitura e da arquitetura. Na poesia barroca era possível ver todas essas questões da dualidade humana, entre o terreno e o celeste, o pecado e o divino. O Arcadismo que quebra com essa escola na literatura, adotando a forma se soneto como base novamente (devido à sua construção racional dos versos), aproximando-se, de certa maneira, do classicismo na música, vale ressaltar.
Recnhecer o barroco e o clássico na arquitetura e na pintura se peguei fácil, mas ainda tenho um pouco de dificuldade de reconhecer na música, vou rever esse post para tentar entender……
A citação da Clarice Braúna sobre a poesia também foi legal, só faltou isso no post para ficar ainda melhor :)
Parabéns pelo post Autores :)
Parabéns, expôs muito bem os conceitos!
Amancio,
Sua análise é muito bem feita e sua alusão às artes plásticas inigualável. A forma didática exposta é primorosa. Parabéns!!!
nossa….adorei,ficará mais divertido ouvir música,com essas informações! eu definia tudo como clássica.rsrs
Amei o blog, obrigada, já posso dizer que tenho algum letramento em musica.
adorei… me ajudou bastante com a pesquisa na escola… obrigada…
Você contribuiu sobremaneira com as aulas de Literatura que ministro em uma escola pública. Apresentar aos alunos a música clássica e fazer uma análise comparativa com obras barrocas é uma experiência gratificante. Muito obrigada !
Parabéns! Muito simples e esclarecedor!
adorei, nunca ouvi uma explicação a respeito da arte barroca e classica que eu pudesse entender tão bem. parabéns…………….
Adorei como descreveu e exemplificou detalhadamente as comparações entre um e outro. Parabéns!!
GOSTEI MUITO.. VOU TIRAR 10 NO MEU TRABALHO DE ARTES HJ.. OBG..
Muito, mas muito bom mesmo!!! adorei!!! Parabéns!! Fazer isso em 40 min é para pouquíssimos!!!
Gostei muito.
Estou fazendo faculdade de música e estudando exatamente isto,sua exposição me ajudou bastante
Valeu
Estou amando este blog, cada dia me surpreende! como é bom desfrutar de tanta elegância e simplicidade para falar dos estilos e da música. Parabéns.
Simplicidade? Eles procuram ser os mais herméticos possivel. Procuram mostrar tanta erudição a ponto de tirar todo o prazer de deixar fluir a musica por si. A arte nao merece tanta complexidade em suas abordagens.
Eu acho esse site muito bom e o trabalho que seus autores fazem aqui é maravilhoso, bem detalhado e sem deixar nenhuma dúvida, para mim, quanto mais detalhado e erudito for melhor e eu ainda acho que não está tão detalhado como eu gostaria que estivesse, mas já está muito bom.
Enfim, cada um tem sua opinião e eu respeito a de todos, eu gosto de site, parabenizo os autores pelo bom trabalho e nunca vou deixar de ser um leitor desse site, apesar de não fazer quase nenhum comentário, mas eu leio todos os artigos postados aqui e por falar nisso, já faz um tempinho que não é postado nenhum artigo novo, eu pensei que era um artigo por semana.
Vivas ao Euterpe e aos autores!!!
Nossa, sou totalmente leiga em música clássica. Estava pesquisando a aplicação do método do Dr. Lozanov, no qual ele recomenda música barroca para estimular o estado de relaxamento e aumentar a aprendizagem em sala de aula. Esbarrei nesse site maravilhoso! Obrigada Amâncio! Com essa aula magnífica sobre a diferenciação clássico/barroco, fica mais fácil compreender os resultados da pesquisa de Lozanov.
Sucesso em sua carreira e que Deus te ilumine sempre!
Clara Mítia, poderia por favor, me dizer que método é esse que você está lendo ? do Dr Lozanov ? do que se trata esse método ?
Obrigado
Caro Amancio,
Considero muito “socioantropológica” a confusão que, em música, se faz entre Barroco, Clássico e Romântico.
Penso que as pessoas fazem uma leitura de trás para frente. Assim: Wagner é romântico, orquestra imensa; Haydn usa um “som ” um tanto discreto, é clássico. Já Vivaldi, ainda mais em instrumentos originais, pega meia dúzia de violinos, é “suave” e passível de se ouvir no rádio do carro a caminho da praia. Ou seja, Barroco virou sinônimo de “brando” (Canon de Pachelbel nas cremações), quando ele foi uma explosão de “gongorismo” musical após a austera Renascença.
Você muito bem disse que os (barrocos) ornamentos exaustivos (na pintura seriam Flamboyant?) foram sucedidos pelo arcádico equilíbrio de Gluck, Haydn, Mozart.
Mas vejamos a extravagância percussionista e instrumental de Biber! Mesmo que o aparato seja pequeno, suas “Battalias” são mais pancada que a Militar de Haydn. Sinto uma tendência a medir emoções pelo tamanho da orquestra.
Muitas vezes, experimento mais “tragédia” em uma ária de Handel do que numa de Puccini.
Obrigado, foi a aula mais completa para o meu conhecimento neste campo. Parabéns.
Heber Fiori, sou professora universitária sempre gostei de utilizar música clássica em sala de aula. O que eu não compreendia é por que nem toda música clássica causava o relaxamento que eu esperava nos meus alunos.
Recentemente descobri os estudos do psiquiatra e educador Giorgi Lozanov. Na década de 60, ele desenvolveu uma técnica chamada “Sugestopedia”, a qual sugere que certos tipos de música têm a propriedade de facilitar a memorização de informações a longo prazo. Isso só é possível pela produção de um estado de “vigília relaxada”, proporcionada especialmente pela música Barroca. Tem alguns artigos científicos explicando, mas como sou leiga no assunto, compreendi melhor quando li essa reportagem aqui: http://www.vocevencedor.com.br/artigos/aprendizagem-acelerada/sugestopedia-de-lozanov-aplicada-aprendizagem-acelerada.
Parece que o cérebro gosta de todos esses estímulos suaves que a música barroca traz.
Espero ter ajudado!
Abraço,
Prezada Clara,
Permita-me dar uma sugestão: talvez a música clássica não funcione generalizadamente para “relaxar” porque o pressuposto de que ela seria mais “suave” nem sempre seja verdade, ou no mínimo nem sempre seja algo fácil de defender tecnicamente em oposição a outros tipos de música.
O problema aqui é tratar “música clássica” ou mesmo “barroco” como se fosse um *estilo* de música, quando na verdade “música clássica” não só não é um estilo de música como compreende inúmeros estilos dentro da sua história, inclusive com música bastante violenta (v. “Música Clássica e Porrada”: http://euterpe.blog.br/historia-da-musica/musica-classica-e-porrada-parte-i) – ela seria melhor chamada de “gênero” musical, em oposição à música popular, do que de “estilo” (v. “Música clássica: um gênero?, um estilo?, uma prateleira de CDs?”: http://euterpe.blog.br/musica-e-cultura/musica-classica-um-genero-um-estilo-uma-prateleira-de-cds). O mesmo vale para o barroco: foi um período musical na história em que vários estilos e técnicas foram empregados, e houve um esforço muito engajado por parte dos compositores para se fazer música adequada a diferentes sentimentos, inclusive aqueles mais intensos (v. “Um banho de seriedade na ópera barroca”: http://euterpe.blog.br/historia-da-musica/um-banho-de-seriedade-na-opera-barroca). Em suma: se sabemos que a alta literatura comporta tantos sentimentos para além de suavidade e placidez, por que não reconhecer o mesmo da música clássica?
Em pesquisas sobre o tema dos afetos causados pela música no ouvinte (como a de Lozanov, mencionada pela Clara), o grande problema me parece ser partir desse pressuposto de que qualquer “música clássica” seja a mesma coisa e que os seus atributos “relaxantes” sejam tomados de pronto, quando na verdade o lado contemplativo da tradição erudita é apenas uma das facetas da sua expressão. A música clássica é altamente provocativa, cambiante, com desafios e acontecimentos notáveis tanto no nível do conteúdo como no nível da forma (há nela o chamado “conteúdo da forma” (v. “Música clássica: o conteúdo da técnica”: http://euterpe.blog.br/filosofia-da-musica/musica-classica-o-conteudo-da-tecnica)), o que a torna o tipo de música menos “relaxante” na minha opinião caso seja ouvida com atenção (mesmo os noturnos de Chopin, tão contemplativos, guardam seções centrais de grandissíssima tribulação, cumprindo uma dialética importante para a sua narrativa).
E mesmo com relação à concentração de quem ouve música clássica praticando outras atividades ela é altamente questionável, porque a música clássica está sempre chamando a atenção para acontecimentos musicais profundamente fundados na forma e, por consequência, na própria física musical (basta acompanhar a dinâmica de tensão e distensão física da harmonia, o que é mais explorada na música clássica do que em qualquer outro tipo de música). Sobre o tema da concentração e da inteligência de alguém que ouve música clássica enquanto pratica outras atividades, e os mitos criados em torno disso, ler: http://www.bbc.com/future/story/20130107-can-mozart-boost-brainpower (em inglês).
Parece-me que música relaxante está muito mais para música new age e algumas trilhas da musicoterapia – essas sem dúvida funcionarão melhor para esses tipos de experimento.
Abraços!
Leonardo
Prezado Leonardo,
Estou impressionada com tantos detalhes diante de um simples comentário meu.
Como eu disse, não sou musicista.
Sou apenas uma simples professora universitária que gostaria de criar um ambiente favorável para o aprendizado em sala de aula.
Conheci o método do médico psiquiatra Dr. Lozanov. Pelo respeito que ele tem mundo a fora, parece-me que seus experimentos não foram feitos em fundo de quintal, não é?
Ah, não me referi a música new age.
O médico demonstrou em pesquisa científica que áreas do cérebro relacionadas à memorização, são positivamente ativadas por música barroca, em especial, Vivaldi.
A Ciência é muito ampla! Olhar para um lado só pode nos fazer escorregar, Leonardo.
Agradeço seus comentários técnicos, mas por amor à Ciência, fico com o método de Lozanov. O mínimo que pode acontecer, é meus alunos descobrirem o gosto pela boa música.
Bem, de qualquer forma, fica meu profundo agradecimento ao Amancio Cueto Jr., por escrever de forma tão simples e delicada, para que leigos como eu, também se apaixonem por música clássica.
Abraço a todos,
Clara
Nao concordo, Leonardo. Clara, experimente Debussy. Muito mais relaxante e gostoso do que Vivaldi, que as vezes, é estressante e nervoso. E olha que eu entendo de musicoterapia, viu?
Há pessoas que dormem melhor com o ronco do parceiro ou a televisão ligada, ou há mesmo o caso de Villa-Lobos, que compunha concentrado em meio à barulheira de crianças em casa e da cidade lá fora. Não tenho nada a dizer sobre a prática do relaxamento ou da concentração de cada um, já que isso é subjetivo. Mas pensando em propostas mais afirmativas, fiz uma sugestão à Clara a partir de uma citação que ela fez de uma pesquisa que toma como pressuposto, sob o nome da ciência, algo injustificável nos termos que estão sendo divulgados. Não o fiz a confrontando nem sequer questionando, mas compartilhei uma reflexão que se aplica a muitas pesquisas feitas com música clássica nesse tema, e que faríamos todos muito bem em considerar de modo crítico caso nos importemos com o conhecimento e com as pessoas que possamos envolver em experiências de musicoterapia (um mero elogio à ciência não garante que uma pesquisa se torne isenta de crítica). Pensar de modo crítico não significa arrogância, nem considerar-se melhor, nem desqualificar uma pesquisa completamente, significa, pelo contrário, dispor-se a interagir ativamente com o que ela apresenta, sendo capaz até mesmo de levá-la adiante depois de uma análise mais rigorosa.
Sobre Vivaldi e Debussy serem “relaxantes”, tal como poderíamos chamar facilmente, quem sabe, a Machado de Assis simplesmente de “dócil” (?) ou a Augusto dos Anjos simplesmente de “pacífico” (?), sugiro, para além das leituras que já havia sugerido no comentário anterior, as seguintes obras:
Vivaldi: a) https://www.youtube.com/watch?v=AA1aqT4up6E#t=606; b) https://www.youtube.com/watch?v=U73a3kNbZEU; c) https://www.youtube.com/watch?v=icBGwJStlyE; d) https://www.youtube.com/watch?v=ws470IUmcqM; e) https://www.youtube.com/watch?v=ws470IUmcqM#t=479; f) https://www.youtube.com/watch?v=YG4JWFA_-uo; g) https://www.youtube.com/watch?v=PDGB25xyE7k; h) https://www.youtube.com/watch?v=VlGtmKZRMsg#t=23; i) https://www.youtube.com/watch?v=gIbO35RSNuo; j) https://www.youtube.com/watch?v=fZYFBnTXqCA; k) https://www.youtube.com/watch?v=T_FfJVmdkLg; l) https://www.youtube.com/watch?v=ScBb0VEZYZc; m) https://www.youtube.com/watch?v=kqbezy4tbZU; etc.
Debussy: a) https://www.youtube.com/watch?v=TGIUXx5elYA; b) https://www.youtube.com/watch?v=2pnCtvGJRgM#t=556; c) https://www.youtube.com/watch?v=hIbqQjQgUPE; d) https://www.youtube.com/watch?v=uqwx_M52z_c; e) https://www.youtube.com/watch?v=2CdKiuQWKjg#t=495; f) https://www.youtube.com/watch?v=Vp1g_gdOOdo#t=40; g) https://www.youtube.com/watch?v=BCONV263rzg; h) https://www.youtube.com/watch?v=r9TmdSyebU4#t=54; i) https://www.youtube.com/watch?v=b90_oatq6lU; j) https://www.youtube.com/watch?v=bW01NSqOA7M#t=30; k) https://www.youtube.com/watch?v=LkjppYOccZU#t=12; l) https://www.youtube.com/watch?v=SMO14vMYEbI; m) https://www.youtube.com/watch?v=h4vjHOZ5C2I; n) https://www.youtube.com/watch?v=lyuj76GoU9Q#t=35; o) https://www.youtube.com/watch?v=zwtJSPyRw2M; p) https://www.youtube.com/watch?v=MwF0b_kI06c; etc.
Mas esses exemplos de Debussy sao exceçoes. No geral, Debussy tem muitas obras relaxantes.
Mas música clássica é a arte das exceções. É a arte de violar regras, refletindo sobre elas.
Quando disseram que Sinfonia era uma obra para orquestra sinfônica, logo logo apareceu um que adicionou coro na sinfonia. Quando disseram que valsas eram em compassos ternários, 3/4, apareceu um que escreveu uma valsa em 5/4. Quando disseram que quartetos de corda eram obras para 4 instrumentos de corda, apareceu um que adicionou soprano ao conjunto. Quando a ópera se encheu de heróis tenores, apareceu uma cujo protagonista é um velho feio gordo e ladrão (e barítono). Quando o concerto se firmou como sendo para instrumento solista e orquestra, um outro escreveu um concerto para violino, piano e quarteto de cordas (e só).
O que eu quero dizer é a mesma coisa que o Leonardo já disse, mas com outras palavras: na música clássica, a exceção é a regra.
Quem adicionou coro a sinfonia foi Beethoven, quem escreveu valsa 5/4 foi Tchaik. Quem colocou voz soprano no quartetos de cordas foi Schoenberg. Poderia citar de qurm sao as outras obras citadas por voce, Amancio. Compositor e obra.
(risos)
Beethoven, Sinfonia nº 9. O último movimento tem coral.
Tchaikovsky, Sinfonia nº 6. O segundo movimento é uma valsa.
Schoenberg, Quarteto de cordas nº2 Op.10. Com soprano nos dois últimos movimentos.
Verdi, Falstaff. Alguns a consideram uma anti-ópera, eu vejo nela uma grande homenagem do velho Verdi à nova geração de compositores operistas. Um dia hei de escrever aqui um texto sobre isso.
Chausson, Concerto para piano, violino e quarteto de cordas Op.21, Ré maior. Isso é muito, MUITO lindo: https://www.youtube.com/watch?v=cKkCuCtJ-Hw
Sintetizando o que está em questão aqui (e que por acaso envolveu o entendimento do que seja “música barroca”, tal como o tema do post): se alguém propõe que tal tipo de música serve para relaxar e/ou estudar, precisa responder duas perguntas – 1) por que especificamente a música que você está propondo seria adequada para isto?; e 2) como essa música causa o efeito de relaxamento ou concentração ou vigília memorizante?
Para a pergunta 1), a generalização para “música clássica”, “música barroca”, “Vivaldi” ou “Debussy” serem “relaxantes” é tanto grosseira quanto parte de um pressuposto injustificável, de que cada um desses conjuntos possa ser simplificado como a mesma coisa, quando não há nada que nos permita pensar que o “relaxamento” seja a regra desses conjuntos em qualquer sentido, tanto expressivo quanto técnico e até mesmo físico. Escolhi mais de 20 exemplos evidentes de música intensa e estressante de Vivaldi e Debussy, mas mesmo uma música lenta de qualquer um dos dois dificilmente pode ser justificada rigorosamente, em qualquer sentido, como uma música relaxante – peguem o segundo movimento do Verão de Vivaldi: https://www.youtube.com/watch?v=AA1aqT4up6E#t=439, isso é música de imensa tensão, melancolia e dissonâncias, tanto técnica e física como expressivamente. Que pessoas a ouçam para relaxar não tem nada de científico, mas apenas de pré-condicionamento e de escuta ensimesmada, o que, com os exemplos de pessoas dormindo melhor com o ronco do parceiro ou com a TV ligada, não quer dizer nada.
E quanto à pergunta 2), eu indiquei um artigo de jornalismo que cita como várias pesquisas feitas em torno do tema chegam a resultados muito discrepantes, a ciência simplesmente não tem resultados sistemáticos e uma communis opinio de diferentes experimentos para este assunto. De fato, pensar em artifícios para crianças conseguirem estudar outras coisas melhor é fruto de uma abordagem específica e de maneira nenhuma inquestionável, que é a do pragmatismo, em que ninguém se contenta em reconhecer o valor que algo pode ter em si, mas sempre espera que as coisas “sirvam” para alguma coisa – no caso da música clássica, ela precisa “servir” para fazer as crianças estudarem melhor outros assuntos, ao invés da própria música clássica ou do próprio estudo bastarem em si mesmos.
A consciência disso tudo é fundamental para quem quer pensar a ciência e a música clássica e especialmente para quem se importa com experiências de musicoterapia, que é uma área que precisa muito de rigor para não cair em embustes de quem não entende do que está tratando.
O tema do entendimento do que é música barroca, que já era tema deste post, foi bem ilustrado como um dos pressupostos apriorísticos mais comuns desse tipo de pesquisa, quando períodos históricos complexos ou obras e técnicas de composição tão variados são simplificados sem nenhuma justificativa.
Como nunca tinha ouvido falar da tal sugestopédia de Georgi (näo Giorgi) Lozanov, fui amansar minha ignorância nas wikipédias. Na alemä encontrei uma crítica concreta à utilizacäo de música barroca nesse método.
Enfim, tem gente que se relaxa vendo tevê, outras com um copo de uísque, por que näo ouvindo Vivaldi ou Debussy?
Agora, reduzir a música de Debussy a uma funcäo relaxante näo merece nem comentário.
Pobre Prete Rosso, pobre Monsieur Croche! Trabalharam feito doidos, passaram fome e doenças, para virarem “relaxantes”, séculos depois de morrerem…
Conforme Schoemberg disse: “Para toda a regra existe uma exceção e essa é a única regra que deveria existir”
Então nós aprendemos todas as regras de harmonia, contraponto, forma e tantas outras para simplesmente quebrar as regras, sendo assim eu não devo mais me preocupar com as quintas e oitavas paralelas, com cadências e modulações, posso compor de qualquer maneira que estará certo, né?, afinal, não existe mais regras alguma.
Só por que um compositor famoso quebrou a regras isso não deve servir de exemplo para que todos façam assim, as regras servem para que tenha uma organização, uma ordem, um padrão.
Desculpem por me intrometer na conversa de vocês, só estou expressando meu ponto de vista, mas respeito a opinião de todos, quem quiser quebrar as regras, que quebrem, eu me esforço para não quebra-las.
Sendo assim, um compositor não pode chegar para outro e dizer: ”Esse acorde está errado, não deveria ser colocado aqui, se fosse eu faria de outra maneira”.
Afinal não existe mais regra, se eu quis colocar aquele acorde justamente ali, está certo, pois não existe mais regras.
Bem colocado, Heber Fiori. Alou, Dr. Wikipedia Monteiro. Nao reduzi a musica de Debussy a algo relaxante. So disse que Debussy é relaxante. Pode ser usado para tal. Tem muitas obras relax. Meteu a mao na grade do tigre, agora guenta!
Heber, nós estamos como que contemplando um belo cânion, mas cuidado para não cair nele! (risos)
As regras existem para que o compositor (iniciante ou não) olhe para o papel em branco e não fique em dúvidas sobre como começar ou o que fazer. Por exemplo, alguém lá no passado criou uma sequência de acordes que sempre soa bonita, e que por isso foi fixada como regra: “para fazer uma música [bonita], vc deve usar essa sequência de acordes”. Mas quando a regra foi criada, ninguém pensou em fazer música feia; ora, e se eu *precisar* fazer uma música feia? Aí vc tem de quebrar a regra. É isso o que Schoenberg queria dizer. E nós ouvintes, ao vermos uma regra quebrada, nós deveríamos nos perguntar por que o compositor quebrou aquela regra, o que será que ele quis dizer com isso.
Um exemplo, a Nona Sinfonia de Beethoven. Se vc acompanha o discurso da sinfonia, vc chega no quarto movimento *precisando* de palavras para expressar o que apenas a música não consegue dizer. O coro não está ali apenas substituindo o que uma flauta ou oboé poderia fazer; e se alguém sugerisse trocar as vozes por instrumentos, me desculpe, ele não entendeu o que a sinfonia queria dizer. O mesmo poderia ser dito do Quarteto nº2 de Schoenberg: o quarteto começa tonal, fá # menor, e vai perdendo a tonalidade aos poucos. Quando se torna completamente atonal, a soprano canta: “Sinto ares de outros planetas”. Não é genial?
Só mais dois pitacos: um compositor, quando quebra regras, nem sempre é famoso. Às vezes ele se torna famoso exatamente por causa dessa audácia. E sobre o “esse acorde está errado, não deveria ser colocado aqui” é exatamente o caso do acorde de nona invertido da Noite Transfigurada de Schoenberg. Se tiver um tempo, dá uma olhada lá para ver por que é que tinha de ser *esse* acorde feio e não um outro mais harmonioso.
Heber e Amancio,
Errar a aplicação de uma regra ou desviar aleatoriamente dela é bem diferente de mostrar algo além dela, o que é sempre bem mais difícil.
No mais, com o nível sendo rebaixado nos comentários (com uma combatividade quixotesca lamentável), nem seria preciso dizer mais nada, mas Monteiro tem razão depois de tudo o que já foi mostrado: Vivaldi e Debussy ou qualquer outra generalização do tipo não são relaxantes em qualquer sentido que possa ser mostrado simplesmente porque não foram feitos para relaxar, mas justamente para o contrário, para chamar a atenção para o que estavam expressando por meio da música, mesmo que ela fosse lenta (que artista escreveria música para relaxar e continuaria se chamando de artista e não de terapeuta?). O relaxamento por si próprio é o oposto da relação de uma pessoa com uma obra-de-arte (mesmo que em um nível pessoal possamos ouvir música para o que bem entendermos, inclusive para lavar louça).
Para relaxar há música pensada especialmente para isso, e para estudar é mais fácil a “Mente Quântica” funcionar do que algo que não foi feito (e sim para o contrário) nem está sendo justificado para isso.
Uma aula, este post… sugestão para o próximo post… “como diferenciar o classismo do romantismo na prática” rs, abraço!
Acabei por traduzir o post no meu blog (https://mozartminore.wordpress.com/2015/07/28/come-distinguere-il-classicismo-dal-barocco/ e posts seguintes). Obrigado Amacio pela autorização :-) (veja-se o comentário do dia 07/5/2012)
Mario Kraus
E obrigado, Mário, pela tradução! Ficou jóia! :-D
Amâncio, não sei se ainda sou benvindo ou tempestivo. Hoje lembrei muito este post porque resolvi ouvir o Messias de Handel na versão de Mozart ,sob Ch. Mackerras. Acrescento que possuo e conheço inúmeros Messias. Aliás, por isto, estou tão acostumado ao texto inglês e aa sonoridade das sílabas, que não deixam de tecer música, a ponto de torcer os ouvidos para o texto alemão. Outrossim, não vou julgar a regência “antiga com instrumentos modernos” de Mackerras, por sinal, um regente que muito aprecio. Nem vou levar em conta os solistas. Mozart colocou árias normalmente “femininas” em vozes masculinas. E Theo Adam é ótimo. Nada disto importaria muito.
Mas por que não gosto do Messias “de Mozart”? Temos ali um Handel clássico e não barroco. E olha que o Messias (dizem que nos últimos anos é a obra erudita mais executada; acho que merece) experimentou, como poucos outros trabalhos, versões, interpretações e regências as mais diversas. Passou por orquestras e coros imensos sob Sir Malcom Sargent. Também a versão de Sir Eugene Goossens, regida por Beecham, com pratos. Depois, na era dos instrumentos originais, veio com roupagem econômica que, porém, não perdia os contrastes e a emoção barrocas.
Aqui em seu Post, está muito bem explicado que o Clássico é simétrico , polido , enquanto o Barroco (anterior e com orquestras menores) surgiu extravagante e contrastante, embora uma mídia simplista insista em rotular Bach e Vivaldi de relaxantes, como se existissem , em qualquer arte, autores totalmente turbulentos ou absolutamente letárgicos. Talvez parte desses equívocos se deva ao tamanho das orquestras e ao fato de o “Canon” ou As Quatro Estações poderem ser tocadas por 13 músicos. Ou porque ,em funerais, os cemitérios recomendam Albinoni ou Ária na Corda Sol…..
Pois bem, Mozart, em seu arranjo do Messias, deixa a orquestra mais encorpada, tudo arredondado, inclusive com floreios nas madeiras. Mas não é Handel, é Mozart, com todo respeito pelo grande Amadeus. Adoro Mahler ,porém penso que ele nada tinha de reinventar as sinfonias de Schumann.
“O Messias de Mozart” está lindo para quem não conhece o original. Sabemos que Mozart era capaz de gênio e drama,inclusive no estilo oratório,como no Requiem e algumas missas, ou seja, em seu clássico-mozartiano território. Entretanto, a meu ver. ele falhou em colocar o seu espírito clássico-rococó no barroquíssimo Handel. Apesar do luxo instrumental, falta a dramaticidade – peculiar e diferente – do Barroco. A linguagem é outra. Não podemos esquecer que emoção, tragédia e grandeza não necessitam de grandes conjuntos. Mesmo o “ultrapassado” Messias sob M. Sargent usa um fraseado barroco. Que o grande Mozart me desculpe, ele diluiu os contornos para dar à obra uma simetria grega, a qual seria mais “relaxante” que o genuíno Barroco.
Olá Flávio! É claro que você é bem-vindo, por que não seria? (Ou será que eu perdi alguma discussão que tenha acontecido em outro post?)
Seu comentário é deveras interessante, e complementa muito tudo o que eu escrevi lá em cima. É necessário lembrar que, desde que as pessoas passaram a ouvir músicas de gerações anteriores (e isso só começou a acontecer na época de Mozart), a moda era adaptar músicas antigas à moda corrente. É por isso que Mozart transforma o barroco Handel num clássico mozartiano, Mendelssohn adapta o barroco Bach em romântico alemão, Mahler dá uma vitaminada nas sinfonias de Beethoven para que elas usem orquestras mahlerianescas, e os regentes de 1950 regem os barrocos com orquestras grandes e fraseado romântico. Era o que a platéia de cada época queria ouvir. A busca pelo “som original” é coisa recente, muito recente.
Sobre os modismos de cada época, eu procuro evitar comparações assim, qualitativas. Assim como eu não meço música impressionista francesa usando a régua romântica alemã, eu também evito comparar Beecham com Harnoncourt, ou Casals com Bylsma. Quando eu quero ouvir a grande Paixão com o Karl Richter, eu transporto o ouvido para 1970 e esqueço o Herreweghe, e vice-versa. Acho que eu sou mais feliz por gostar de ambas as gravações, e reconhecer méritos nos dois estilos.
Caríssimo Amâncio, obrigado por me considerar bem-vindo. Você nada fez em contrário. Eu que pensava talvez ser este assunto datado, todavia, em Arte, nada (ou tudo?) é datado!
Gostei de tua assertiva “oportunista” de gozar tanto Harnoncourt como Beecham. Se bem lembras, eu, a princípio, rejeitei tal postura “total flex” ante o Mahler de Lucerna-Abbado, porém concordei depois : melhor aproveitarmos todos os aparentemente hereges.
A questão da atualização do “vestuário” é normal desde a mitologia grega. Temos pinturas de Hércules e Apolo em trajes renascentistas, óperas de argumento pagão com vestes barrocas ou até modernas.
Temos os regentes “antigos” com instrumentos modernos e os diretores HIP “modernos” com instrumentos de época, assim como dispomos de vários tipos de “atualizações” as mais discutíveis.
Desta forma, eu não quis tirar o direito de Mozart quanto à atualização “clássica” do Messias, para o fim do sec. 18. O que eu pretendi, talvez não expliquei bem, foi usar esta revisão de um gênio por outro gênio para exemplificar como uma obra de feição barroca pode virar clássica e, “estranhamente”, menos contrastante do que a original e mais “primitiva”. Abração!
P S: Amâncio, ouço O Messias desde criança, sob Beecham, Solti,Bernstein, Scherchen, Davis, Gardiner, Pinnock, Christophers, Harnoncourt, Marriner, e muitos outros. Senti todos como ,de alguma forma, Handel. Porém ,este de Mozart-Mackerras, sinto como Mozart e não me gratifica. Sinto falta de “drama” na revisão Mozart. Porque ela se reveste de classicismo.
Quis exemplificar como estamos errados em julgar o Barroco como “discreto”, o que caberia mais ao Rococó-Clássico, ou seja, a tônica de teu artigo. Sabem ser dramáticos, à sua moda, Mozart e Haydn. Assim como Bach, Vivaldi e Handel. Cada macaco em seu galho!
Olá Flávio, sim eu entendi o que você havia dito no primeiro comentário, e concordei com ele. As tais “adaptações à moda corrente” são feitas exatamente para que a música perca uma de suas características e ganhe outras à gosto do freguês. Quando Mozart foi adaptar o Messias de Handel, ele deve ter pensado exatamente o que você notou: “ei, esta música está contrastante demais, dramática demais; a platéia quer ouvir belezas mais clássicas, elegantes e arredondadas; vou mudar isto e isto”. E voilà! Seu comentário é riquíssimo exatamente por mostrar que o “pensamento clássico” não se restringia à composição da música, mas também ao modo como eles enxergavam a música dos seus mestres.
Já o modismo de hoje é procurar o som que a música tinha quando ela foi escrita. Leonardo, semanas atrás, publicou no facebook um link para uma matéria do New York Times com uma professora que reaprendeu a tocar piano da maneira de Mozart. Quer dizer, na nossa era, já não basta tocar “o piano de Mozart”, ou “o violino de Paganini”, ou “reconstruir o cravo de Bach”: a moda agora é tocar com as técnicas de execução daquele tempo. Modismo? Eu acredito que é sim. Mas só iremos ter certeza daqui a algumas décadas.
Amâncio, o assunto é apaixonante ,polêmico e recorrente. Faz frio aqui no Rio Grande ,regado a vinho,então vou voltar um pouco à “vaca fria” dos HIP. No meu e-mail ,apareceu o link da Christine norueguesa, que aqui não aparece. Acessei , li e ouvi: é interessantíssimo, ainda mais que ela se baseia em tratados antigos que norteiam inclusive a postura do tecladista e de seus cotovelos. Acredito brilhantes os comentários de Leonardo no Face, mas sou refratário e insubmisso ao supergregarismo do Face. Não tenho acesso e não pretendo.
Enfim, como já foi bastante debatido aqui em outras postagens, a dicotomia entre instrumentos (e agora posturas físicas) originais versus modernos parece eterna. Nem presumiria que algumas décadas a resolverão. Porque estamos aqui diante de um fenômeno mais emocional que racional-histórico. “A música tem um pé na física e outro na estética”. A nossa estética depende de nossa emoção, ou prazer. Assim, com todo respeito pela pesquisa dos adictos do HIP, também respeito os fanáticos do outro lado, que defendem que Handel adoraria um coral de 80 figuras, Beethoven amaria um Steinway, etc… Jamais o saberemos.
A verdade é que eu gosto muito de Bach ao piano em lugar do cravo. Subjetivismo meu, é claro. Outro dia, eu comentava com Fred que as interpretações HIP, independente dos instrumentos originais, costumam fazer dos adágios um andante. Há também pela rapidez uma tendência. Sabemos ,historicamente, que os regentes do séc. 19 eram quase sempre mais rápidos, não duvido que os pianistas do séc 18 fossem todos mais saltitantes e frescos, porém a minha estética, talvez historicamente deformada, prefere que um adágio seja um “adágio”. Claro que, noutros momentos, reconheço nos HIP até mesmo maior vigor.
Afinal, se levarmos bem a sério o “purismo”, as últimas sonatas de Haydn-Mozart e a primeira metade das de Beethoven …deveria ser tocada ,não só com os cotovelos “à norueguesa”, mas com fortepiano e jamais sequer num Essenfelder.
Penso que tais modismos são cíclicos. Os clichês e excelências de Karajan-Bernstein levaram Gardiner a tocar Berlioz com orquestra de época. Tudo é interessante. Mas espero que não ousem Bruckner e Mahler com instrumentos sei lá de que época. Seja como for, somos todos fanáticos e devemos nos abrir ,sim ,a novos estilos, que talvez nos condicionem no futuro, como fomos condicionados no passado. Décadas ou séculos, as musas nos dirão…Quem sabe ainda vamos aderir a teclados e orquestras eletrônicas!
Amei!!!
SImplesmente magnanimo… sou meio que leigo em musica, um material tao excelente e de anos atras, somente hj achei e aprendi muito com isso
A ideia da ilustracao com pinturas e arquitetura, Que Deus o Abencoe.
Muito bacana as análises!!!
Obrigado Prof. Amâncio, suas explicações foram claras e muito esclarecedoras, em especial pra mim, um leigo em teoria musical e em história da arte da música, mas um apaixonado pela música clássica (ou erudita). A maioria dos comentários, percebo…, ser de alto nivel, tecidos por especialistas músicos ou estudiosos, confesso …fiquei voando, mas doido pra entender.
Excelente e dinâmicos texto e apresentação. Acrescento para o clássico a simetria e linearidade, a estrutura em blocos numa coesão geométrica. No barroco as formas curvas, contorcidas, desenvolvendo-se como folhagens ou conchas. A estrutura em terraços, repetindo-se nesses degraus, e contraste em blocos separados. No rococó isso se amaneira, e as folhagens desenvolvem mais subdivisões, agora delicadas, leves. O clássico manterá inicialmente, a graça desse rococó, cortando-lhe os excessos de nuances (ornamentos etc), isso será uma das marcas de Mozart.
Gostaria de parabenizá-lo pelo artigo, muito esclarecedor, agradável de ler e acompanhar. Obrigado!
Foi um exercício delicioso e um aprendizado bastante produtivo.
Obrigada , muito obrigada por oferecer seu tempo e conhecimento.
Excelente explanação! Muito obrigado por dedicar seu tempo para elaborar esse post!
Gostei bastante da simplicidade das explicações. Pra quem está iniciando, como eu, é bem animador. Obrigada por dedicar seu tempo. Foi útil para mim.
Gostei muito do post… Mas mesmo depois de ler, ainda estou com uma dúvida e não consigo resolve-la. O “Violin Concerto in A minor, RV 356 Op 3 No 6” de Vivaldi, é Barroco ou Clássico? Quanto mais eu ouço, mais eu me confundo… E isso está me atrapalhando na hora de tocar :/ qual você acha mais apropriado?
Oi Amanda! O concerto é esse aqui, né?
https://www.youtube.com/watch?v=QPba-i26YNA
Esse concerto é barroco, e eu digo isso de cara não porque eu li o nome “Vivaldi” no título… mas porque, como eu toco violoncelo, a parte que mais me chama atenção é sempre a do baixo. E esse baixo deve ser super-divertido de tocar, todo cheio de voltinhas, nada repetitivo (quando você acha que sabe onde vai estar a próxima pausa, a música muda de direção). Você, que é violinista, veja que o violino tem bastantes notinhas para tocar, muitos detalhes. Pega por exemplo aos 45 segundos do link do vídeo. Agora tenta comparar com este concerto do Mozart (o violino começa aos 1 min 19 seg):
https://www.youtube.com/watch?v=N-mA9OMP3DE&feature=youtu.be&t=78
É muito mais melódico, as notas não estão ali de graça ou em excesso. Mesmo quando chega aos 2min 20seg, tem bastante notas mas ainda parece seguir a melodia. O acompanhamento no Vivaldi é muito mais rico do que no elegante Mozart. Enfim… Vivaldi é barroco, não tenha dúvidas!
Muito obrigada! Agora, com a interpretação correta, vai ficar mais fácil de atingir a musicalidade (assim espero, rs)!
Abraços :)
Amanda Arcangelo
Torres Gêmeas seria clássico? Empire State Barroco?
Hum… Bem, vejo que você pegou a idéia geral da coisa, mas já que estamos prestando atenção nos detalhes para diferenciar barroco do clássico, acho que seria mais interessante prestar mais atenção ainda e diferenciar também o art déco do Empire State do modernismo funcional das Torres Gêmeas.
O Art Déco trabalha com geometrismos, curvas perfeitas, linhas retas, simetrias, lembrando os maquinários das fábricas. Veja o topo do Chrysler Building de Nova York:
Já o World Trade Center pode ser visto como um Art Déco levado ao extremo, muito mais linear e com menos detalhes decorativos, extremamente funcional, quase minimalista. Aqui, o prédio da ONU:
Então, se fôssemos comparar com música… acho que o Empire State estaria mais para o dodecafonismo e as Torres Gêmeas seriam serialistas (ou minimalistas).
Opa, valew! Ainda bem que perguntei, porque é fácil extrapolar o que a gente ‘aprende’ pra outras coisas e acabar errando heheh! Valeu pela informação.
Parabéns pelo
artigo! Muito esclarecedor, de fácil compreensão para qualquer pessoa entender. Excelente comparação com outras ciências.
No entanto, se você ouvir o requiem de Mozart e o Glória de Vivaldi seus argumentos vão estremecer e voltar à estaca zero…
J Sabino
(risos) Será mesmo? De qualquer modo, você nunca pode esquecer que Música Clássica é o gênero das exceções por excelência, basta alguém criar uma regra que já já aparece um compositor para violá-la e mostrar que pode haver vida inteligente no lado oposto da regra. Quando alguém disse que “Sinfonia” é música puramente orquestral, veio um alemão e fez uma sinfonia com vozes e orquestra. Quando alguém disse que “Concerto” devia opor dois grupos instrumentais, outro alemão escreveu um concerto para cravo solo (aliás, esse mesmo alemão escreveu 6 suites para violoncelo solo quando disseram que o violoncelo era um instrumento apenas para fazer acompanhamento). E quando a forma-sonata se estabeleceu e ditou que os temas deveriam ser apresentados todos na Exposição, já apareceu um jovem apresentando tema no Desenvolvimento. E por aí vai… De qualquer forma, é preciso entender primeiro a regra para depois conseguir entender as exceções.
Voltando ao Vivaldi vs Mozart, tenho alguns trechos aqui para você ouvir e avaliar. Logo no início do Gloria, repare que os violinos ficam tocando umas voltinhas tipo ornamentos (fá#-sol-lá-sol-lá-sol-fá#), revezando com os trompetes, bem vivazes, como no Brandenburgo 2 do Bach:
https://youtu.be/RMHguvZPcqQ?t=8
Já no clássico o trompete sempre acompanha os tímpanos, sem voltinhas, apenas notas simples, como você pode acompanhar aqui no Confutatis do Requiem de Mozart:
https://youtu.be/bKBMoYq1KS0?t=177
(Aqui você vê ele imaginando esse mesmo trecho com todos os instrumentos):
https://youtu.be/USe-wZ0AOQQ?t=291
Na entrada das vozes no Gloria e depois na sequência, é fácil ouvir os contrastes de forte/fraco, com coral/sem coral, sem meio termos:
https://youtu.be/RMHguvZPcqQ?t=36
Mas o Requiem está cheio de crescendos, só homens/só mulheres/só orquestra/todo mundo, meio termos e outras sutilezas, como no miolo do Dies Irae:
https://youtu.be/S_e7K7io92g?t=736
No “Laudamus te” do Gloria você encontra aquela riqueza do barroco, baixo movimentado, e soprano e mezzo com melodias bem ornamentadas:
https://youtu.be/RMHguvZPcqQ?t=399
E a “forma” tão cara para os compositores clássicos está em cada canto do Requiem, como por exemplo no movimento inicial que é claramente um ABA.
A = Requiem… https://youtu.be/S_e7K7io92g?t=340
B = Te decet hymnus… https://youtu.be/S_e7K7io92g?t=408
A = Requiem… https://youtu.be/S_e7K7io92g?t=476
Seja como for minha intenção era que todos escutassem as duas obras geniais para apreciá-las sem pretensão comparativa e ver que os dois gênios continuam em plena forma.
Sobre clareza; Vivaldi fazia o que queria com as partituras, pois as dominava completamente…aqui no largo do inverno é tão claro quanto o Sol! Clareza de causar inveja a “iluministas”! Aqui com um dos maiores virtuosos e o acompanhamento sofisticado!
https://www.youtube.com/watch?v=GNeAbvvmwxI
J Sabino
Olá J.Sabino!
Realmente, escutar duas obras geniais com atenção é a melhor parte disso tudo! Porém, repare que em nenhum momento eu quis fazer comparações qualitativas, nem das obras nem dos compositores. A idéia com todo esse texto é apenas destacar características estilísticas, para o ouvinte identificar melhor o que é barroco e o que é classico, sem entrar no jogo subjetivo de dizer o que é bom e o que é ruim. Isso vai do gosto de cada um.
E obrigado pelo vídeo! Já leu a análise que nós fizemos aqui sobre as Quatro Estações? O concerto de inverno está no último post de uma série de quatro.
Sobre o Glória trata-se de rito tradicional católico cristão, que na época de Vivaldi era de propriedade (as partituras; a obra com seu formato e estrutura) da Igreja Católica do Vêneto, de modo que entre nas primeiras décadas entre 1700-1720 foi revisado sempre para melhor pelos mestres venezianos com a participação documentada historicamente de Gionanni Maria Ruggieri em seguida pelo Maestro della Pietà Vivaldi… no catálogo: (Ruggieri: Rv Anh; por volta de 1708; chamam de Glória de Ruggieri) e RV 588; 589 por Volta de 1714-15 que é a versão que conhecemos do famoso Glória de Vivaldi
Att,
J Sabino
Muito legal. Posso dizer que “tudo que sei, é que nada sei”, sem medo de errar, rsrsrs. Mas e quanto ao estilo de Claude Debussy, Camille Saint-Saens, e Maurice Ravel ? Onde se encaixam ? E Joaquim Rodrigo e seu belo Concerto de Aranjuez ? Agora eu fiquei super curioso pra saber essas nuances que as diferenciam !
Parabéns pelo blog.
Olá Carlos,
Legal que eu tenha despertado curiosidade em você! A idéia é bem essa: se abrir para as nuances da música, é isso que faz toda a diferença!
Quando a gente fala de história da música, não existe apenas Barroco e Classicismo. Antes do Barroco houve a época do Renascimento, com Josquin Desprez, Gabrieli, Palestrina, Lassus, Monteverdi e muitos outros. Depois do Classicismo temos o Romantismo com três fases: a primeira fase com Schubert, Mendelssohn, Chopin e Berlioz, a segunda fase com Verdi, Wagner, Brahms, Dvorák e Tchaikovsky (e Saint-Saëns), e a terceira fase juntando diferentes estilos que preparam para o Modernismo: tem a escola impressionista com Debussy, os pós-românticos com Mahler, Richard Strauss e Rachmaninoff, os realistas com Puccini e Leoncavallo, os expressionistas e muitos outros. O que desencadeia na mistura de estilos e fases que é o Modernismo: o dodecafonismo (Schoenberg, Webern e Berg), o nacionalismo modernista (como Villa-Lobos e Bartók), o neoclassicismo (Joaquim Rodrigo, Bartók teve uma fase aqui, Stravinsky também); depois da Segunda Guerra vem o serialismo (Boulez), o experimentalismo (Cage), o minimalismo (Glass, Pärt), o neorromantismo, e a lista vai longe.
Enfim, é assunto para uma conversa BEEEM longa…
Maravilhosa explicação. Cheguei durante uma aula de história da música. Me apaixonei pelos exemplos e forma de tu explicares com as onomatopeias “parará” rs. Amei. Gostaria de ler um livro sobre história da música, com essa linguagem. Será que tem?
Olá Brenda, se você souber de um livro assim, me avise que eu também quero um! Talvez um dia, depois de eu ganhar na Mega Sena, eu escreva um para nós dois. :-)
Que entrega para um post, incrivel! Obrigada de coração.
Quanto amor quanto carinho desenvolvido neste trabalho.. me emociono em poder desfrutar de um conteúdo tão rico. Que Deus lhe abençoe sempre!
Prezados (as),
VIVALDI é o CLASSICO dos CLASSICOS…Esse papo de “trinados”, “instrumentos se atropelando (não vejo isso em VIVALDI, pois há Harmonia sofisticada o tempo todo)”, uma “melodia de casa vez e acompanhada (aparece várias vezes em VIVALDI)”, “ornamentos” para mais ou para menos…Isso não caracteriza nada, pois todos os compositores copiaram, imitaram e ainda imitam o mestre veneziano e os demais mestres italianos… Amadeus estudou com os mestres italianos e sua música é emprestada de SALIERI, MARTINI, VIVALDI, SCARLATTI, VIOTTI, CLEMENTI entre outros… Aqui a obra prima da Musica Sacra superior aos demais compositores que conheço: Trata-se do Salmo Dixit Dominus de VIVALDI…Há vários desses, oratórios e óperas “perdidos” atribuídos a Handel, Bach e outros, mas são de VIVALDI!!! https://www.youtube.com/watch?v=aKRadU-n104
Pesquisador de História da Arte
J SABINO
Olá Sabino!
Você, como pesquisador de História da Arte, deve bem saber que a história da arte pode ser dividida em fases estilísticas, como o barroco, o rococó, o classicismo, o romantismo, o modernismo e tantos outros -ismos. Este artigo trata exatamente sobre este tema, sobre as características de duas dessas fases. “Clássico” aqui não está se referindo à música clássica como um todo, mas apenas ao período do classicismo, que vai mais ou menos de 1750 a 1820. Você deve bem lembrar que Vivaldi faleceu em 1741, antes do início do classicismo, então uma atribuição a ele de “clássico dos clássicos” fica obviamente subentendida como um arroubo impreciso de um fã apaixonado.
Além disso, estudiosos de Vivaldi como Marc Pincherle (1888-1974), Peter Ryom (1937-) e o editor Gian Francesco Malipiero (1882-1973), todos testemunharam o renascimento e descoberta das obras de Vivaldi no início do século XX. Após o falecimento do mestre veneziano em 1741, Vivaldi tinha se tornado um completo desconhecido. Isso mudou em 1926, quando foi descoberto um lote de manuscritos num monastério em Piemonte com 300 concertos, 19 óperas e mais de 100 obras vocais. Hoje os manuscritos se encontram na Biblioteca de Turim, e você consegue ler sobre essa história nesse site: https://ibmp.it/en/the-history-of-manuscripts/ . Os manuscritos incluem o Dixit Dominus RV.594 que você gosta, e mais o famoso Gloria RV.589, que pôde teve sua primeira execução após a morte de Vivaldi em 1939 graças a um concerto organizado pelo Alfredo Casella. Por isso sua afirmação de que outros compositores o copiaram e o imitaram fica meio sem base histórica e comprobatória. Você teria alguma fonte que possa compartilhar com a gente para sustentar essa afirmação?
Realmente fantástico! Este texto é de uma didática exemplar. As comparações com outros tipos de arte, as ilustrações funcionam na perfeição para que qualquer leigo (como eu) na matéria consiga um vislumbre do assunto.
Muitos Parabéns!