Em 17 de julho de 2012, por Greg Sandow
Shuffle.Play.Listen [Embaralhe.Toque.Escute] — esse é o título de um CD duplo de Matt Haimovitz/Christopher O’Riley, que eu deveria ter blogado há eras, especialmente depois que ouvi Chris e Matt tocarem uma versão ao vivo do CD.
Entre outras coisas, ele revoluciona o repertório para cello/piano. (Eis um link no Spotify, se você quiser ouvir.) Quando ouvi a versão ao vivo (na George Mason University em Virginia), as peças eram anunciadas enquanto (ou depois) eram tocadas, ao invés de serem listadas em ordem no programa. Então no começo eu não tinha ideia de qual era a primeira peça.
Claramente é algo do séc. XX, pensei. Um compositor com muitas peças para cello/piano, um expert em escrever para esses instrumentos, separadamente ou juntos. E alguém cheio de drama. E tem imaginação. Um estilo um pouco difícil de situar. Pós-1945, pensei. Mas quem? Não consegui pensar em alguém que soasse como aquilo. Não tenho a pretensão de ter um conhecimento exaustivo de repertório, mas realmente, pensei, se alguém era assim tão bom, não haveria pelo menos uma pequena pista?
Ao fim era uma peça da trilha de Bernard Herrmann para Vertigo, o filme de Hitchcock. É claro que já havia ouvido a música de Herrmann, então talvez devesse tê-lo reconhecido. Mas… cello e piano? Eu não teria pensado que ele escreveu música para cello/piano. Então ele nunca me veio à mente. E é claro que ele não escreveu essa peça para cello e piano. Chris a arranjou, instantaneamente – ao meu ver, de todo modo – acrescentando uma impressionante obra nova ao repertório para cello/piano.
Você vai encontrar uma suíte inteira de Vertigo nos CDs, mais arranjos de canções de Arcade Fire e Radiohead, canções de outros grupos pop, uma faixa impressionante de John McLaughlin, “A Dance of Maya,” que foi um dos destaques da apresentação ao vivo, simplesmente trazendo a multidão aos seus pés.
Mais (no CD) a Suite Italienne de Stravinsky, e peças de Martinu, Janácek e Astor Piazzolla. Stravinsky e os dois checos, é claro, escreveram suas peças para cello e piano. Mas os arranjos soam tão idiomáticos quanto. Você não percebe, ouvindo as faixas pop, que está ouvindo uma espécie diferente de música, uma em que os papéis de cello e piano fossem mais simples. De jeito nenhum. Trata-se de um material formidável para cello/piano, do início ao fim. Como eu disse para Matt e Chris depois do concerto, eles deveriam publicar os arranjos, e cellistas em todo lugar deveriam tocá-los.
No CD, você tem primeiro Herrmann e o repertório clássico, e então, no segundo, o pop e o jazz. O que faz menos diferença do que você pode pensar, já que as peças mais simples, mais melódicas, menos contemporâneas estão do lado clássico.
Mas eu gostei muito mais de ouvir as peças misturadas ao vivo. Eu nunca sabia o que estava por vir, e podia (por exemplo) curtir a clássica sonoridade de Martinu, sem sentir que ela pertencia a um longo período clássico específico. Essa é uma das razões pelas quais eu sou tão empenhado em dizer que cada peça era repertório sério para cello/piano. Porque, com os estilos misturados, foi assim que elas soaram.
Então por que este é outro modelo para aquilo que a música clássica pode ser, quando tivermos um novo público? Porque ele se adequa perfeitamente ao nosso mundo mais abrangente. Há vários tipos de música. Aqui estão dois músicos formidáveis, fazendo a sua própria seleção. Isso é o que a maioria de nós faz quando ouvimos, em streaming ou reproduzindo CDs. Então agora um concerto clássico não está isolado do mundo mais amplo, ou talvez não seja mais um refúgio dele. Ele é parte do mundo, e cada nota da música mostra isso. Mesmo cada nota das peças clássicas, porque não devemos nunca esquecer que a música clássica é – e merece ser – parte da cultura mais abrangente. Ela apenas não tem funcionado muito bem assim.
O que esta gravação – e os concertos derivados dela – ajuda a mudar.
O público na George Mason era difícil de delimitar. Não era bem o público clássico que todos conhecemos, mas também não era um público jovem e com tatuagens. Pessoas ecléticas em seus 40, 50 anos? De qualquer forma, uma expansão do público clássico, suponho, com algumas pessoas clássicas nele. Exatamente o tipo de público que esperamos conseguir, uma vez que ampliemos o nosso alcance.
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E – eis um ponto que mal posso enfatizar o suficiente – eu não estou dizendo que todo momento em toda apresentação clássica deve ser novo e eclético. Vamos ter que ver o que evolui, mas eu imagino um mix amplo. Especialmente à medida que o que for apresentado venha em última instância dos músicos! Alguns vão favorecer música mais antiga, alguns mais nova. Alguns vão favorecer peças clássicas, outros serão mais diversos.
O que é crucial é não deixar nada de fora. Uma noite só de Schubert, Les Noces na próxima semana, Shuffle.Play.Listen no meio da semana, e então um concerto planejado por estudantes, como aquele de meu último post, acontecendo no meio da rua. Então uma retrospectiva de Stockhausen, e então meu amigo Stewart Goodyear tocando sua maratona de Beethoven, todas as sonatas em um único dia. Se o Kennedy Center aqui em DC programasse seus grandes eventos assim, eu poderia estar lá toda semana.
“Programming for a new audience — Shuffle.Play.Listen”, por Greg Sandow, traduzido por Leonardo T. Oliveira.