Em 2 de julho de 2012, por Greg Sandow
Bem, prova é uma palavra forte. Mas eu pensaria que o envelhecimento do público da música clássica – durante um período de cerca de apenas 50 anos – é um sinal muito forte de que nossa cultura mudou. E mudou para cada vez mais longe da música clássica.
Mas primeiro voltemos um passo. Estou escrevendo mais posts para esta série atual do que eu esperava. Então para nos reorientarmos: Minha tese principal é de que construir um público novo, jovem para a música clássica deveria ser a nossa prioridade mais urgente. Por quê? Porque estamos perdendo o público que temos, e nunca vai haver outro público – ou ao menos não um proximamente tão grande como o atual – que vai abraçar a música clássica como nós a apresentamos agora.
Para encontrar esse novo público jovem, temos que fazer grandes mudanças. Citando o que escrevi antes, temos que: (1) mudar a maneira como apresentamos a música clássica (2) mudar o repertório que tocamos, e (3) tocar nossa música mais vividamente. (Antes, eu disse “tocar melhor”, mas não soa preciso, e dava a impressão errada de que eu penso que tocamos mal.)
Se você seguir o link, vai encontrar muita coisa sobre as mudanças que temos que fazer em nossa apresentação. E, não, elas não envolvem realces sobre o concerto, como (por exemplo) mudar a iluminação no auditório quando o clima da música muda. Ao invés disso, temos que mudar a maneira como um concerto é sentido, de modo que as pessoas que vêm se sintam bem-vindas, envolvidas, e totalmente informadas sobre o que está acontecendo no palco.
Então, tendo dito isso tudo, vou passar agora para as razões por que devemos mudar a música que tocamos. Elas estão vinculadas com as mudanças que temos visto na cultura ao nosso redor. Volte um pouco para ver algumas maneiras como eu abordei isso. Depois deste post, vou prosseguir com a música em si – quais, exatamente, poderiam ser as mudanças do repertório.
Mas com respeito à idade do público: Por muitos anos, a maioria de nós pensava que o público clássico sempre foi velho. Mas esse não é o caso. Pesquisas feitas em gerações passadas – remontando aos anos 60 e antes – mostram um público muito mais jovem do que aquele que temos agora, um público com uma idade média em seus trinta anos. Coletei esses dados, com evidência anedótica, aqui. (Parece que sou o primeiro em nosso tempo a descobrir esses dados e torná-los disponíveis, pelo que fico feliz em levar crédito.)
Então aqui está o verdadeiro quadro. Até os anos 60, tivemos um público que não era mais velho, grosso modo, do que o resto da população em geral. Nos anos 70, ele começou a envelhecer, e tem envelhecido desde então. (Embora possivelmente tenhamos descontado isto pelo menos um pouco, com programas vigorosos – concertos especiais, descontos em ingressos, e coisas do tipo – para atrair pessoas mais jovens.)
Nos anos 80, de acordo com dados do National Endowment for the Arts [Fundo Nacional para as Artes], a porcentagem do público de música clássica abaixo de 30 anos caiu pela metade. E desde então a presença de grupos mais velhos também diminuiu, até 2008 (de novo, de acordo com dados do NEA) apenas pessoas com 65 anos ou mais iam a apresentações clássicas tão frequentemente quanto suas contrapartes iam no passado.
Por que isso teria acontecido? Teria sido (como sei que muitos de nós acreditam) porque a música clássica deixou de ser ensinada em nossas escolas? Provavelmente não. As pessoas mais jovens que – diferentemente de suas contrapartes em décadas anteriores – notavelmente deixaram de ir a concertos clássicos nos anos 80 cresceram em um tempo em que a música clássica ainda era ensinada. Mas o ensino não as tornou fãs de música clássica. (Se você ler o livro de Dave Marsh, The Second Beatles Album [O Segundo Álbum dos Beatles], vai encontrar um proeminente crítico de rock destruindo as aulas de educação musical que recebeu quando era um garoto do ensino médio nos anos 60, considerando-as repressivas e fora de contato com o mundo ao redor dele.)
Então penso que o público envelheceu porque a cultura mudou. Aqui estão algumas coisas que estou certo de que todos nós sabemos, mas vou dizê-las, apenas para enfatizar quão grande foi essa mudança. Mesmo antes dos anos 60, algo radical aconteceu: uma nova geração de adolescentes brancos começou a ouvir nos anos 50 o que era essencialmente música negra popular, também conhecida como rock & roll. Nunca tivemos tal irrupção da cultura negra na cultura branca mainstream. Nos anos 60, o rock (depois de anos em que que ele já soava mais branco) tomou um rumo decisivo de volta para suas raízes negras. Junto com isso veio o movimento de direitos civis, trazendo todo tipo de ideias, cultura e políticas negras para a cultura mainstream.
Nada disso tocou a música clássica de qualquer maneira substancial. E esta é apenas uma de muitas mudanças culturais. Recomendei, em meu último post, um livro de Mark Harris chamado Pictures at a Revolution [Quadros de uma Revolução], que mostra como os filmes mudaram nos anos 60 – como, de fato, Hollywood se dividiu em facções velhas e jovens, e como as facções jovens (influenciadas pelos filmes vanguardistas da França) venceram, mudando os filmes para sempre. A cultura popular estava se tornando arte, algo que nós também (é claro) vimos acontecer com o rock.
Então as pessoas que cresceram nos anos 60 – e, ainda mais, duas décadas depois, quando as mudanças se enraizaram ainda mais profundamente – não se relacionavam com a música clássica como as gerações anteriores haviam se relacionado. Ela não refletia o mundo delas.
E elas agiram com base nisso, não indo aos concertos clássicos. As pessoas com 30 anos ou menos que pararam de ir a apresentações clássicas nos anos 80 nasceram nos anos 50 e 60. O que significa que – mais crucialmente – elas cresceram nos anos 60 ou nos anos 70, fazendo delas a primeira geração a crescer depois que as coisas começaram a mudar. Elas cresceram na nova cultura emergente.
Agora adiante o relógio. Com cada década passada, a cultura muda cada vez mais, e pessoas mais jovens se afastam cada vez mais da música clássica (se afastam do seu som, sua sensibilidade, e do tipo de vida retratada nas antigas obras-primas). Elas a ouvem ainda menos do que suas contrapartes em décadas anteriores ouviam, e vão cada vez a menos concertos clássicos.
E pessoas um pouco mais velhas também vão menos do que suas contrapartes nas décadas anteriores. Em 1990, pessoas de 40 a 50 anos nasceram entre 1940 e 1950, o que significa que elas cresceram quando a cultura havia apenas começado a mudar, em um tempo em que o público clássico ainda era jovem. Elas acolheram a música clássica facilmente, e mantiveram seu interesse à medida que ficaram mais velhas. O que em 1990 fez delas um forte segmento do público clássico.
Mas o relógio continua se movendo. Logo é o ano 2000. Pessoas agora em seus 20 anos cresceram em uma era em que a nova cultura tinha praticamente dominado tudo. Elas não estarão entre o público clássico, nem agora nem depois (e de fato, como eu disse, não tem estado desde os anos 80). Pessoas em seus 30 anos, igualmente, cresceram depois que a música clássica começou a perder sua posição central em nossa cultura, então elas vão menos frequentemente a concertos do que suas contrapartes anteriores iam.
Mas e as pessoas de 40 a 50 anos? E as mais velhas? Elas ainda são importantes amantes da música clássica, e agora formam o núcleo do seu público. Elas são as mesmas pessoas que tinham 30 ou 40 anos (ou mais) em 1990, e ainda vão a concertos orquestrais, ópera, música de câmara, recitais solos.
Aqui está um gráfico que fiz a partir dos dados do NEA e que mostra isto acontecendo:
Em 1992, a maior faixa etária entre o público de música clássica era a de 35 a 44 anos. Em 2002, a maior faixa etária é a de pessoas com 45 a 54 anos – as mesmas pessoas que constituíam a maior faixa etária em 1992, agora dez anos mais velhas. (Eu ajustei os dados para mudanças na idade geral da população. Então os números não mostram a porcentagem de cada faixa etária em 2002, mas qual seria a porcentagem se o número de pessoas naquela faixa etária – da população inteira – tivesse continuado o mesmo).
E assim o público envelhece. Em 2012, o grupo dominante deve ser agora de 55 a 64 anos.
A chave para isso tudo – a coisa mais importante a se lembrar – é que o que molda sua relação com a música clássica não é quantos anos você tem. É quando você nasceu. Se você cresce quando pessoas mais jovens se voltaram naturalmente para a música clássica, você bem pode desenvolver um interesse, e manter esse interesse à medida que envelhece. Mas se você cresceu depois que a cultura começou a mudar, pode não desenvolver esse interesse.
E então, à medida que as décadas passam, o público fica mais e mais velho. E claro, isso significa que ele encolhe. Algumas pessoas mais jovens chegam a ela, é claro. Mas não há o bastante delas. Não há o bastante para manter os segmentos mais jovens do público tão grandes como eles foram no passado.
Não podemos retroceder a mudança da cultura, então a única maneira de tornar o público mais jovem – o que temos que fazer, se quisermos que ele ainda exista – é trazer as mudanças culturais para a música clássica.
O que, como veremos, tornará as coisas mais inteligentes, mais artísticas – certamente mais criativas – e muito mais divertidas. Detalhes por vir.
“Building a young audience (proof of the culture change)”, por Greg Sandow, traduzido por Leonardo T. Oliveira.