19abr 2017
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A crise da música clássica, por Greg Sandow

Greg Sandow em seu avatar

Há anos o famoso crítico e compositor americano Greg Sandow escreve em seu blog sobre a relação da música clássica com a nossa cultura atual e o que ele identifica convictamente como uma crise. Mas que crise? A crise da música clássica, ora.

Crise

Fora coisas práticas como queda na venda de ingressos, dificuldade de apoio financeiro e envelhecimento do público (especialmente se olharmos para a sequência das últimas décadas), há aquele distanciamento da música clássica da vida das pessoas em geral, algo quase incompreensível se compararmos o caso com outras artes, como a literatura, as artes plásticas e o cinema. Pois com a música, é como se mesmo o valor mais eminente que ninguém nega da sua tradição clássica estivesse sujeito a uma visão positivista de algo que com o tempo se tornou ultrapassado, que já não tem como nos tocar da mesma maneira depois de Elvis ou os Beatles. Em suma, viraram peças de museu, o que às vezes se vê mesmo na apreciação de quem gosta dela. E quanto a compositores contemporâneos? Poucos sequer suspeitam que eles existem, e muitos os acusam de terem se aburguesado e estragado tudo…

Sandow acompanha esses problemas e as iniciativas do mundo clássico em resposta a essa crise, especialmente formatos mais modernos de concertos e atividades que se propõem a envolver novos públicos. Mas ele também reflete sobre o discurso dos apologetas da música clássica (aquele discurso que em algum momento nós também nos importamos em assumir), tantas vezes recheado de vícios de ataque à cultura popular ou de justificativas pragmáticas que não tocam no valor da arte em si. Dessa perspectiva, Sandow tem oferecido um testemunho atento às mudanças da nossa própria cultura e de como a música clássica se comporta dentro dela – e, pensando em seu futuro, de como terá que se comportar se quiser sobreviver.

Livro

Paralelamente aos posts do blog, Sandow está preparando um livro chamado Rebirth: The Future of Classical Music, que há anos também compartilha com os leitores em suas versões parciais. Recentemente, enfim, trechos apresentados de uma versão final e revisada foram postados, e o autor já começa a escrever alguns posts preparando o território para a discussão mais abrangente que pretende lançar com o livro (ao mesmo tempo em que também prepara sua atuação direta como consultor de instituições nos Estados Unidos, função que já vinha praticando nas últimas décadas).

Como eu julgo que acompanhar essa discussão é central não apenas para os Estados Unidos, mas ainda mais para o Brasil (e a sempre bem-vinda participação de nossos amigos lusófonos), trago essa introdução do Sandow, feita em uma série de breves posts recentes, em tradução para Euterpe (autorizada pelo autor). E espero trazer para os leitores a discussão desse conteúdo tão atual, que nos faz pensar em coisas que talvez nos assustem, caso simplesmente nunca tenhamos dado importância ao tamanho descompasso entre a música clássica e a cultura atual e em qual seria o preço para adequá-las.

1. Um tempo selvagem, em 12 de junho de 2012
2. A grande mudança, em 14 de junho de 2012
3. Por que o público vence a apologia, sempre, em 15 de junho de 2012
4. Construindo um público jovem (primeiro post), em 19 de junho de 2012
5. Colocando isso em prática, em 20 de junho de 2012
6. Construindo um público jovem (segunda parte), em 24 de junho de 2012
7. Construindo um público jovem (mais sobre música nova)
, em 27 de junho de 2012
8. Construindo um público jovem (mais sobre a mudança da cultura), em 28 de junho de 2012
9. Construindo um público jovem (prova da mudança da cultura), em 2 de julho de 2012
10. Programando a música clássica para a nova cultura (primeiro post), em 8 de julho de 2012
11. Boulez e Godard, em 11 de julho de 2012
12. Programando para um novo público: um exemplo, em 13 de julho de 2012
13. Programando para um novo público — Shuffle.Play.Listen, em 17 de julho de 2012
14. Programando para um novo público — mais exemplos, em 20 de julho de 2012
15. Programando para um novo público — coisas que funcionaram, em 24 de julho de 2012
16. Nova programação — expandindo a caixa, em 25 de julho de 2012
17. Repertório — post final, 31 de julho de 2012
18. Tocando mais vividamente, para o novo público, em 2 de agosto de 2012
19. Tocando mais vividamente — segundo post, em 6 de agosto de 2012
20. O que temos que fazer, em 11 de setembro de 2012
21. Quatro pontos para o futuro, em 13 de setembro de 2012

Leitores atentos perceberão que todo esse assunto diz respeito a posts que já apareceram por aqui, especialmente na categoria “Música & Cultura”. Considerações minhas, portanto, sobre a postura e várias das ideias do Sandow, em breve. Enquanto isso, usemos os comentários!


Este post tem 59 comentários.

59 respostas para “A crise da música clássica, por Greg Sandow”

  1. Bom sobre o afastamento da população da música clássica, oque eu percebo é: hoje em dia quando andamos pelas ruas, de ônibus e até mesmo no trabalhos, ouvimos as pessoas ouvindo rock, samba, axé e tantos outros estilos de música e raramente ou quase nunca ouvimos alguém ouvindo a quinta sinfonia de Beethoven e as quatro estações de Mahler. Um certo dia eu estava no meu serviço e um colega colocou um CD de um concerto para nós dois ouvirmos, uma amiga que estava ao lado disse “essa música é música de louco” ela chamou um concerto de música de louco….rsrs….., se Mozart estivesse presente naquele momento, teria um ataque de indignação ou um ataque cardíaco devido a estupidez que a menina disse, eu fico admirado, por que sempre percebo isso. As pessoas falam que eu sou culto, que tenho cultura, só por que eu estudo e aprecio música clássica? acho que cultura é muito mais do que somente isso, são as pessoas que não tem cultura e o país que não incentiva na cultura como se deveria. Quando o caminhão do gás passa na rua as pessoas falam o seguinte, “olha a musiquinha do gás” elas nem fazem ideia de que aquela musiquinha é Fur Elise, composição do grande mestre Beethoven. É isso que sempre percebo…… :)

  2. Heber Fiori, não seria as quatro estações de Haydn ou Vivaldi? Bem, queria comentar que hoje ouvi a Arte da Fuga, de Sebastian Bach. Fiquei pensando com meus botões, quem – não entendendo de música a fundo – teria saco de ouvir uma música tão abstrata, tão requintada. Não é música fácil; para todos, não! não é música agradável. De jeito nenhum. Todos repetem em coro que Bach é um gênio, mas, não há maior prazer do que SENTIR NA PELE esta genialidade. Meu Deus, hoje me deliciei com Bach! Não parei de fazer audições no terreno perigoso da música erudita contemporânea e moderna, mas, de forma diametralmente oposta, tenho descoberto a cada dia a música erudita antiga. Tenho me deliciado com as obras para órgão de Couperin, os madrigais dramáticos, a música sacra de Vivaldi (poucos conhecem), os Motetos Isorrítmicos do grande Guillaume Dufay (um verdadeiro requinte composicional e matemático).
    Se já é difícil para um intelectual comum se enveredar pelos caminhos dos mestres tradicionais do clássico e do romântico, imagine entrar no universo contemporâneo ou, pior, da música antiga? Dufay não é prá qualquer um. É para poucos. Então não fique triste, você não está só. Somos apaixonados por algo raro, Fiori.
    Ontem mesmo descobri a Cantata Francesa, uma espécie de ópera em miniatura, escrita no século XVII, para uma burguesia emergente, música intimista. Descobri, neste meio, um compositor chamado Marin Marais, que consagrou à viola todo um repertório de obras-primas de graça e qualidade de escrita. Ouvi ele ontem. E também ouvi Buxtehude, o maior organista da Alemanha antes de Bach, que levou a escola ao apogeu. Ouvi Buxtehude ontem em homenagem à Seleção Alemã de Futebol, que se aproxima de sua vitória final. Além dele, ouvi hoje, sem sair da ordem, todas as sonatas para violino de Heinrich Ignaz Franz Biber, o maior representante da escola de violino na Alemanha da época barroca. Muito mais sério e conciso do que os italianos barrocos. Quem ouve isso aqui na Bahia? Poucos, meus caros.

  3. Assisti a um concerto de musica de Bach no Dom de Leipzig -St. Thomas ha duas semanas e a plateia era de gente madura. O mundo mudou ate na Alemanha!!!!

  4. Leonardo,

    só quero deixar registrado aqui a importância desta discussão, e agradecer a você a iniciativa de traduzir os textos e trazer esta questão à baila. Obviamente eu vou repercutir essa história na minha página, tentando meter meus palpites.

    Desde já você está de parabéns por trazer esta importante reflexão para nós, visto que em português a discussão deste assunto está muito mais devagar do que deveria.

    Abraço,

  5. denison rosario, realmente são as quatro estações de Vivaldi…..rs…..disfarça……

    É bom saber que existe ainda espalhados pelo mundo pessoas que apreciam música clássica, mas, a maior parte do tempo fico rodeado de pessoas que não apreciam e criticam sem ter o devido conhecimento da arte.

  6. Tenho 58 anos de idade, e desde que me entendo por gente, é esta mesma lengalenga sobre a crise e, a possível morte da música erudita!

    Será que ela já morreu, e não fomos avisados?

    Porque, pelo que me consta, a mesma continua a sua vidinha como SEMPRE!

  7. E tem outro detalhe que ninguém falou aqui ainda. Aqui tem uma banda popular em minha cidade chamada Chiclete com Banana e tem uma cantora popular chamada Ivete Sangalo. Todos ouvem hoje Chiclete com Banana e Ivete Sangalo. Talvez 10% da humanidade escutem eles. E apenas 1% escutam Beethoven. Mas, se considerarmos a longo prazo, quantos estarão ouvindo Ivete e Chiclete daqui a 50 anos ou 100 anos? A medida que os anos passam, diminuem a quantidade de pessoas que ouvem bandas e cantores populares. Já Beethoven, ao longo de todo esse tempo, desde vivo em Viena, já era ouvido, foi ouvido depois de morto, é ouvido hoje, mesmo que por poucas pessoas, mas, considerando a longo prazo, daqui a 500 anos, por exemplo, Beethoven será mais ouvido do que qualquer banda ou cantor popular. Já pensaram nisso?

  8. O que o Beto Naseri e o denison rosario disseram é verdade, bandas vem e vão e as pessoas só ouvem porque é a “sensação” do momento, mas não passa de um momento. Já Beethoven, é eterno, porém, a minoria de população ouve, por que será?

    Imaginem um mundo onde todos ouvem música clássica e somente a minoria da população ouve popular :)

    isso fica somente na imaginação :)

  9. A discussão que o Greg Sandow mantém é importante porque traz questões sobre algo em comum que apreciamos (música clássica), levando-nos a revisar (ou passar a construir) uma opinião sobre cada uma delas. Por outro lado, quando vejo debates, de forma geral, sobre a quantidade de pessoas que se dedicam a algo (que é a essência desse trabalho de Sandow) ao longo do tempo, percebo que geralmente se esquecem de considerar algo aparentemente simples: o crescimento da população global. Vejam essa curva impressionante:
    http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/b/b7/Population_curve.svg
    Em 1800, havia 1 bilhão de pessoas no mundo. Em 1927, passou-se para 2 bilhões. Em 1999, chegou-se aos 6 bilhões e hoje, pouco mais de dez anos depois, já estamos aos 7 bilhões de seres humanos neste planeta! Chamo a atenção para uma comparação que está sendo feita sobre um tempo que havia 1 bilhão de pessoas no mundo com outro que tem (por enquanto) sete vezes mais. Isso tem um reflexo sério (para não dizer drástico) sobre qualquer projeção estatística no nível que está sendo colocado (mundial). Isso para se falar apenas nessa variável.
    Outro aspecto fundamental a ser considerado é o acesso à música por meio da tecnologia. Imaginem uma população assustadoramente crescente, como vimos acima, utilizando cada vez mais tecnologias para conhecer e ouvir música, especialmente associadas ao fenômeno relativamente recente da Internet… Eu penso na minha época de contatos iniciais com a música clássica, como era tudo tão delimitado e concentrado, com canais restritos e “controláveis”, até bem mensuráveis, de acesso. Hoje, a coisa fugiu do controle por várias frentes!
    Constato, assim, que é insuficiente (e até equivocado) se continuar pensando essa questão de público da música clássica por parâmetros antigos e tradicionais de acesso a teatro, presentes em concertos, vendas de discos etc. Evidentemente, continuam válidos os investimentos públicos e privados em eventos com música clássica. Mas a música clássica em si está sendo acessada e circulando de forma absolutamente livre e independente disso; fora de qualquer controle! Ou seja: não há como se avaliar, realisticamente, como está e como será o envolvimento do público com a música clássica.
    Podemos fazer o exercício de comentar, discutir e refletir sobre contextos muito pontuais e superficiais da atualidade. A música clássica propriamente dita está muito viva – e acredito que sempre estará viva, pelo menos por mais alguns séculos, de uma forma ou de outra, estritamente aliada às tecnologias da informação e comunicação.
    Esses foram meus dois tostões por enquanto.
    Abraços!

  10. Fred, compartilho integralmente da sua opinião. Aliás, acredito que nunca, em nenhum tempo, a música clássica esteve tão difundida pelo mundo como está agora, graças em parte à facilidade com que hoje as pessoas tem acesso à informação de qualidade e execuções primorosas e variadas a um simples click de mouse. Sempre lembro que eu demorei quase 10 anos para conhecer todas as 9 sinfonias de Beethoven; hoje eu entraria no Youtube e minha curiosidade estaria eliminada. Também lembro como era difícil encontrar lojas especializadas ou “amigos de amigos” que podiam importar LPs clássicos; hoje existem várias Amazons. Informação também não é problema, temos o Google com um acervo infinitamente maior do que o da Biblioteca Pública do Paraná. E sobre a questão do “público jovem”, preciso contar isto a vcs, aqui em Curitiba eu faço parte de um grupo de amigos que se reúne a cada dois sábados apenas para ouvir música clássica. E o grupo, formado por senhores com mais de 60 anos, sempre fica surpreso não só com minha pouca idade (eu tenho 36) mas também com a juventude e o alto nível de conhecimento dos amigos que eu convido para as minhas reuniões.

    De qualquer modo, considero válidas todas essas idéias do Greg Sandow sobre como criar um público novo para a música clássica, apóio plenamente. Só não gostaria de justificar esse movimento como um “combate à queda de audiência”; vamos formar platéias novas porque há espaço para isso, e não para sustentar a indústria da música que há em volta. Esta sim é que está passando por uma crise, esta sim é que precisa ser reinventada, e não a música clássica em si.

  11. Amancio Junior e todos voces, belas declarações. Parabens. Eu me lembrei, Amancio, quando ouvi maravilhado a narrativa da sonata para piano e violino de Debussy na casa de Ze Luis, um amigo meu. Fiquei espantado com a beleza da narrativa, da falta de dialogo linear, aquela musica quase parada no ar, parecia se desenvolver em agua e nao no ar. Levei anos para pesquisar toda a grandiosidade do acervo de Debussy. E a cada descoberta, um prazer inenarrável. Hoje com o OI radio, com radio uol, youtube e iTunes eu teria ouvido tudo rapidamente, sem tempo de absorver…e sem ter paciencia de ir descobrindo aos poucos.

  12. Eu creio ser exagero, não só há compositores no cinema fazendo sucesso como a música clássica está fazendo uma mesclagem com um genero muito inusual, o metal, e não falo aqui somente de Nightwish e derivados, mas Septic Flesh e Virgin Black.

    Agora, brasileiro não tem alta cultura, brasileiro ouve música pra se reproduzir ou se esconder de bandido e o mundo também está se abrasileirando, então..

  13. Charles,

    Crossovers e trilhas de cinema, como coisas outras que são, não me parecem ter qualquer representatividade no que o Sandow pretende discutir, que é a relação da música clássica com a cultura atual. E mesmo o tipo de “sucesso” desses que você menciona também não me parece ser o tipo de relação com a cultura de que ele fala.

  14. When I was 18, I bought a record called The New Music. It featured Kontra-Punkte by Karlheinz Stockhausen and Threnody for the Victims of Hiroshima by Krzysztof Penderecki. I was incredibly proud of myself for giving this music a try, even though the Stockhausen sounded like a cat running up and down the piano, and the Penderecki was that reliable old post-Schoenberg standby: belligerent bees buzzing in the basement. I did not really like these pieces, but I would put them on the turntable every few months to see if the bizarre might one day morph into the familiar. I’ve been doing that for 40 years now, and both compositions continue to sound harsh, unpleasant, gloomy, post-nuclear. It is not the composers’ fault that they wrote uncompromising music that was a direct response to the violence and stupidity of the 20th century; but it is not my fault that I would rather listen to Bach. That’s my way of responding to the violence and stupidity of the 20th century, and the 21st century as well.

    http://www.guardian.co.uk/music/2008/jul/09/classicalmusicandopera.culture

    Botando mais lenha na fogueira.

  15. Quando eu tinha 18 anos, eu comprei uma gravação chamada “A Música Nova”, contendo Kontra-Punkte de Karlheinz Stockhausen e a Trenódia para Vítimas de Hiroshima de Krzysztof Penderecki. Eu estava incrivelmente orgulhoso de mim mesmo por dar a esta música uma chance, mesmo que Stockhausen soasse como um gato correndo para cima e para baixo no piano, e Penderecki fosse o típico pós-Schoenberg velho-de-guerra: abelhas em pé de guerra zumbindo na colméia [em inglês, é um trocadilho com a letra “b”]. Eu realmente não gostava dessas peças, mas eu sempre as colocava para tocar de vez em quando para ver se o bizarro poderia um dia se transformar em algo familiar. Tenho feito isso já há 40 anos, e ambas as composições continuam a soar ásperas, desagradáveis, sombrias, pós-nucleares. Não é culpa dos compositores se eles escreveram músicas duras como resposta à violência e estupidez do século XX; mas não é minha culpa que eu prefira ouvir Bach a eles. Esta é a minha maneira de responder à violência e à estupidez do século XX, e do século XXI também.

    A resposta do Tom Service, no link do Leonardo, é excelente mas um tanto longa para colocar aqui nos comentários. Se eu tivesse de responder, a única observação que eu faria seria sobre os exemplos que ele escolheu como “música nova típica”. Diferente do que acontecia nos séculos anteriores, hoje temos uma diversidade grande de estilos correndo simultaneamente, então não dá pra jogar no mesmo saco Stockhausen, Copland, Reich, Berio, Lutoslawski, Pärt e tantos outros. Tudo soa diferente e individual, nem tudo soa como gatos e abelhas.

  16. Esse vídeo da “Trenodia” é absurdamente legal. Me fez entender menos mal a obra e até me emocionar – de verdade – no final, quando há um cluster-borrão que parece simbolizar o horrendo BRANCO da explosão nuclear. Arrepiante.

  17. Pois é, Adriano, tem coisas que não podem ser descritas com acordes de Dó Maior, tônica-e-dominante. Eu entendo perfeitamente as pessoas que não gostam das “modernosidades”, tenho uma amiga que diz com toda a razão, “quando chego em casa no final do dia, eu quero ouvir uma música para relaxar”. Há momentos para Bach e há momentos para Penderecki (mesmo que estes sejam raros – e deveria fazer uns 2 anos que eu ouvi a Trenodia pela última vez). Músicas como esta TEM de existir, seja por motivos políticos, seja para nos fazer lembrar de que o ser humano é capaz dos horrores mais absurdos. E que estes horrores jamais se repitam.

    Como já tinha dito uns comentários aí atrás, há espaço na música para todas essas manifestações. Nem todo mundo gosta de peixe cru (e nem todo mundo precisa gostar), mas não é por isso que os restaurantes japoneses tem de deixar de existir.

  18. Caras, adorei o post, nunca tinha visto esse blog, nem qualquer outro sobre música erudita. Gostei também dos comentários das pessoas, todas procuram dar fundamentos às suas opiniões.
    Quanto ao público jovem, eu já estou dando a minha contribuição (tenho 18 anos) para essa renovação do público.
    Se depender de mim, a música erudita JAMAIS vai morrer.
    É isso aí! Vlw \o/

  19. A pouco acompanho esse site, o que despertou em mim várias questões: qual o propósito da música na antiguidade? Como os compositores reagiam com esses propósitos? Ora, os compositores antigos, de certa forma, procuravam criar novos sons, idéias mas sem fugir do grande público que a música se propunha. Não acho errado essa vontade de renovação ou criação, mas a música ao longo do tempo se desenvolveu de tal forma que poucos ouvintes (isso inclui vários daqui e eu também) acompanharam essa evolução sem ter tempo de digerir e apreciar essas mudanças. Como foi dito em um comentário acima, o acesso a informação hoje é tão fácil que conseguimos tudo de forma mais rápida, sem ter tempo de apreciar! Nesse sentido acho que tudo isso reflete sim na formação do público para a música. Será que um elemento crucial pode ter colocado a música (nova) em geral num outro plano: o registro sonoro! Um meio de deixarmos de frequentar o concerto são os registros, assim como é um meio de contato para toda a música, porém passamos a frequentar concertos não para ouvir novas músicas (coisa que antigamente era o que se fazia, compositores apresentavam novas composições) mas para “ver” o que já ouvimos (no caso da música do âmbito popular, os shows).
    Desculpem qualquer fuga ao tema do texto e qualquer erro de digitação, escrevi pelo celular, depois escrevo melhor no computador, mas achei interessante registrar essas questões que me apareceram após ler esse texto!

  20. Emk primeiro lugar, fiquei feliz de encontrar através do Google um site com alto nível de discussão e conteúdo, e este ótimo texto.

    Mas queria entender de uma forma diferente, algo que vai remeter à infame discussão de Hanslick ou à mais recente análise de Bourdieu. Uma das razões da queda da música clássica está na perigosa separação entre alta e baixa cultura. Particularmente não gosto desta divisão, carrega um tom de superioridade e arrogância que nem mesmo nossos compositores mais queridos carregavam. A música popular, seja ela a MPB, o rock e o jazz possuem valor próprio intrínseco, valioso para aqueles que conhecem suas linguagens e sinais. São incompreensíveis para aqueles que não estão imersos no seu campo de valores. Pegue o rock. Dentro dele, também há divisão entre alta e baixa cultura, desde os anos 60. A banda Residents ironizava esta diferença em seus álbuns (Especialmente Meet the Residents, Third Reich´n´roll e Commercial album). Ouvintes de Captain Beefheart, Wire, Gastr del Sol e Clouddead se consideram intelectualmente superiores a aqueles que ouvem música das rádios. Mesmo os metaleiros abominam a cultura comercial, como se a música deles, como qualquer outra, não fosse. Alíás, é o sonho de qualquer metaleiro fazer música virtusoa, muitas vezes com orquestra, para afirmar seu valor musical, e, quiçá, ser aprovado por papai e mamãe na festinha de família. Como é inteligente, este menino.

    Creio que precisamos entender que no campo da cultura, especialmente arte abstrata, como a música, onde não é possível julgar valores de forma objetiva, como na física, na medicina, os valores são principalmente construídos na cultura e na identidade dos indivíduos. O processo de educação é também o aprendizado do valor, não somente dos conceitos. Acredito, como apreciador de música erudita, que construímos nossa identidade com valores e hábitos fechados, e não conseguimos converter esta nosso cultura para uma linguagem mais desejada e acessível. Desta forma, passa a impressão de uma arrogância antiquada, indesejada. Se fosse uma arrogância com sensação mais dinâmica, talvez voltasse a ser mais desejada.

    http://www.livrariacultura.com.br/scripts/resenha/resenha.asp?nitem=22490328&sid=17020311515129551524935281

    http://www.livrariacultura.com.br/scripts/resenha/resenha.asp?nitem=1857570&sid=17020311515129551524935281

  21. Curioso Sandow comentar que a música erudita passou a distanciar-se da ~vida~ das pessoas a partir dos anos 60. Outro dia eu via um documentário (o primeiro episódio da série Martin Scorsese presents the Blues) e um sujeito, não lembro quem era, dizia que uma revolução que bandas como Rolling Stones e Beatles produziram foi a de mostrar que qualquer um poderia pegar um violão ou uma guitarra e começar a cantar. E penso que estes instrumentos são hoje o que o piano e o violino já foram um dia. Então, assim, mesmo o público que tem alguma educação musical provavelmente terá uma voltada à música popular. E ela é, em alguns sentidos, mais ligada à ~vida~, mesmo. Por exemplo, alguns rapazes fizeram um evento amador de blues aqui na faculdade ano passado. Simplesmente emprestaram o cinema – que lotou nas duas noites -, plugaram umas guitarras e tocaram. Todo músico era convidado a subir no palco para tocar junto; eu não fui porque sou tímido, rs, mas até quem mal sabia o que estava fazendo subiu lá e se divertiu, assim como quem ouvia. Então você tem essa possibilidade de participar, de fazer algo junto, não é algo que está ~lá~ distante. Acho que isso pesa muito a favor da música popular. Eu seria o último a propor que músicos eruditos passassem a convidar pessoas da plateia para fazer uns improvisos no meio das apresentações, mas creio que a maioria dos jovens gosta daquilo em que pode se envolver ativamente (claro que é possível fazer isso através de uma audição atenta somente), que faça dançar, que emocione (e é preciso conceder que talvez uma canção dos Beatles toque mais o coração de muitos do que um noturno de Chopin, e está bem assim, pois ninguém tem nada que ver com as sensações dos outros). A música clássica não é familiar, nesse sentido. Ainda mais para pessoas que, como eu, moram em cidades provincianas, onde não há orquestras, concertos, e até os profs de violino são raros.

  22. Louis,

    Acho que o Sandow adoraria a ideia de chamar o público para improvisar em um concerto/recital com repertório clássico. E de fato, a presença da improvisação no repertório clássico simplesmente não tem por que ser negada hoje em dia, já que parece ela própria um reflexo dessa ligação mais plena e espontânea dos músicos com essa música (o que não por acaso existe tão facilmente em música popular). Creio que essas ideias não precisam ser encaradas com aquele espírito normativo e unidimensional com que se discute, por exemplo, o formato do concerto padrão. Ora, se a música popular ou mesmo outras artes se dão ao direito de uma presença tão diversificada na cultura, por que a música clássica, que em tantos sentidos é tão mais profundamente variada e abrangente, também não se permitiria diferentes formatos e presenças por aí? Daí esse incentivo de ideias do Sandow não precisar sequer ser uma intimidação ao formato tradicional dos concertos, como se alguma coisa estivesse sendo difamada ou perdida com essa pluralidade.

  23. Peço licença mais terei discordar.

    Em tempos era dispensada a devida consideração a arte musical, ela não era tratada como um meio simplesmente, ou como algo acessório, divertido, algo para preencher o vazio ocupado pelo silêncio ou nos termos contemporâneos, um entretenimento. Mas é de se lembrar que isso varia de acordo com as perspectivas sociais, momentos sociais.

    A música é uma experiência sensorial que atinge o intelecto, não há a menor necessidade de uma “participação direta”, sobretudo em sua execução, e, mais ainda, a música não só execução.

  24. Diego,

    A presença de outras artes na cultura também gera vários contextos dos quais as pessoas individualmente discordam, que não consideram o ideal, como haver poemas de Shakespeare impressos em papel higiênico, etc. Mas é uma presença que por si só significa um status muito mais integrado à nossa cultura, algo que perpassa a nossa época em diversos níveis e esferas. A música clássica perdeu essa presença, tornou-se um bem cultivado dentro de um nicho, como se fosse mais específica do que a cultura popular, quando na verdade justamente a transcende, porque reflete uma diversidade potencialmente universal, tanto em valor como em grandeza, e não local e temporal como a moda. Por isso um formato de apreciação do repertório clássico em que os ouvintes também pudessem participar livremente não deveria ameaçar em nada a música clássica em si, mas apenas ser mais uma possibilidade que não tem por que ser negada a ela. Ela deve ser muito maior pra que esse tipo de conversa se ressinta dela ser “ameaçada” por tão pouco e por coisas tão espontâneas.

    Mas considerando a proposta em si e pensando sobre o improviso e sobre o formato de saraus musicais, de todo modo esse é um tipo de encontro musical perfeitamente rastreável na tradição clássica, não nos esqueçamos disso também.

  25. Caro Leonardo,

    Você acabou apontando, nas primeiras linhas, o que eu inúmeras vezes tento repelir e não consigo, externar idéias sem que haja qualquer interferência de ideais. Só que vejamos, quando tento desconsiderar a ideia de uma participação livre dos ouvintes na execução da música clássica, vem a seguinte imagem: um determinado intérprete está executando a Sonata Op.106 de Beethoven e, não mais que de repente entra um ouvinte e começa a interferir na execução, independente de qual seja o movimento da sonata, o que teríamos neste episódio? Qual seria a reação dos outros ouvintes quanto a esse episódio?

    Consegue visualizar a questão? Não é um vislumbre de uma “ameaça”, mas sim uma problemática quanto até que ponto o ouvinte poderia participar da execução das obras, e em quais obras seriam aceitas tais participações.

    Outro problema, Leonardo, seria a seguinte questão: se concedermos uma só possibilidade de o grande público -e aqui me refiro em sentido unicamente quantitativo- participar da execução das obras, iria gerar um incidência maior desse público nos concertos, e agora eu lhe pergunto, você se sentiria à vontade ao ver, em quase todos os concertos que você for, certos indivíduos cometerem atos como aquele relatado aqui no Blog, quanto a 9° Sinfonia de Beethoven? Ou mesmo quanto ao caso hipotético supracitado?

    Fazer concertos como Liszt fazia, é uma ideia salutar, mas a possibilidade de o público, enquanto indivíduo que entra em contato com o repertório da música clássica diretamente no momento de sua execução, é uma ideia muito discutível. Estaríamos minando uma possibilidade de outras pessoas verem a “diversidade potencialmente universal” da música clássica.

  26. Diego,

    Contextualizar o porquê do incentivo desse tipo de ideia era importante em primeiro lugar, daí eu fazer questão de lembrar que, antes de tudo, já é estranho que tenhamos essa postura de defesa em relação à música clássica, quando outras artes estão tão mais presentes em nossa cultura e proporcionalmente tão mais vivas que não é necessária essa preocupação em relação a elas: ninguém tem medo das pessoas se tornarem maus leitores de Shakespeare por ele aparecer em alguma novela ou em algum bloco de carnaval, porque isso é um mero reflexo da sua disponibilidade muito mais franca e estabelecida em lugares mais adequados.

    Mas, isso posto, discutindo agora a ideia em si da participação direta do público na execução do repertório clássico, de fato, isso teria que ser feito de maneira inteligente para fazer sentido! E o Sandow dá um exemplo disso neste texto aqui: http://euterpe.blog.br/programando-para-um-novo-publico-um-exemplo. Leia sobre o momento improvisatório do concerto comentado, ele me parece perfeitamente possível.

    Quanto a esse tipo de concerto acostumar mal ao público e deseducá-lo quanto a concertos de proposta silenciosa e contida, é o tipo de receio de que eu dizia no começo, que só temos porque a música clássica está tão distante da cultura em geral que achamos necessário assumir uma postura provinciana em relação a ela, para protegê-la, porque parece que qualquer mudança pode ameaçá-la como um todo. Mas um argumento contra esse receio é que a participação do público em um concerto não o torna alheio à música, pelo contrário: torna o público muito mais atento e inteligente. Isso é o que o Sandow descreve em uma experiência excepcional quando o público foi incentivado a aplaudir sempre que achasse pertinente em um concerto que ele ajudou a organizar, baseado na comprovada expectativa de Mozart ao escrever a Sinfonia Paris de que o público parisiense aplaudiria em momentos-chave de entusiasmo na execução da sinfonia. Ele diz que nessa ocasião os aplausos se tornaram realmente inteligentes e atentos à música, inclusive com o cuidado de serem breves porque as pessoas estavam ansiosas para ouvir o que viria em seguida. Algo parecido também aconteceu quando o Sandow promoveu um concerto com música contemporânea em que no final o público votaria na sua obra favorita entre três apresentadas no dia: as pessoas prestaram muito mais atenção, lembravam-se das passagens favoritas daquela música e sabiam justificar o porquê de terem gostado mais de uma obra do que de outra. Ou seja, são esses os reflexos de uma participação que não torna o público disperso e mau criado, mas muitíssimo mais engajado.

    Como eu disse naquele post sobre a Desumana exigência de civilidade nos concertos, isso não significa que eu pense que o concerto silencioso é ruim e que deve ser culpado por um envolvimento tão pobre do público atualmente com a música dos concertos, com a desculpa de que o público não “participa” o bastante por ser engessado pela etiqueta do concerto. Não, porque ouvir em silêncio obviamente ainda tem suas vantagens (o cinema não tem etiqueta muito diferente e vai muito bem nesse sentido). Mas eu de fato acredito na necessidade de haver uma pluralidade de formatos que permita à música clássica estar mais presente em nossa cultura, e nesse sentido boas ideias, que variam de proposta e de experiência para o público, devem sempre ser bem vindas.

  27. Leonardo,

    O seu terceiro parágrafo demonstra o que eu realmente temo, cairmos em uma análise meramente “pessoal” da situação. Deixar para que um determinado público aplauda certos momentos que eles julgarem pertinentes é extremamente duvidoso e, é um abrir espaços para compositores charlatões, porque veja, há alguns mecanismos que possam induzir estes ouvintes a aplaudirem tomando como base um problema fisiológico, a dizer, em ouvintes cansados em razão de uma jornada intensa de trabalhos diários eu posso abrir mão dos instrumentos de percussão, sobretudo os tímpanos, e dessa forma, conseguir incitá-los a aplaudir uma sucessão de fortíssimos.

    Quanto à questão de termos uma postura defensiva em relação à música clássica, devo acrescentar que ela, à música, é muito mais propensa a servir de base para ideologias. Diferentemente das outras manifestações culturais-artísticas, tais como as artes plásticas, a música foi introduzida no cotidiano humano há muitos anos, só que na Idade Moderna isso aconteceu de forma mais abrupta e intensa, até pouco tempo atrás a única diversão do homem urbano, no âmbito artístico, era ter um rádio que reproduzisse as tendências musicas. Você cita o fato de ninguém insurgir contra alguém que ponha a poesia Shakespeariana em um bloco de carnaval ou mesmo em uma “novela”, mas será que isso realmente acontece? E esse mesmo processo é valido para a música?

    A poesia Shakespeariana pode ser colocada em qualquer lugar e a qualquer pretexto que mesmo assim ela continuará viva, não perderá sua força? Então o que você me diz de haver pessoas que se mostrem contrários a traduções esdrúxulas e imprecisas? Podemos mesmo pegar o último movimento da 9º Sinfonia de Beethoven e repeti-lo incansavelmente, “ad nauseam” e mesmo assim não estaríamos nos enganando quanto estarmos ouvindo Beethoven, ou deveríamos perceber que não estamos de fato ouvindo a 9º Sinfonia de Beethoven, ou mesmo Beethoven, mas tão somente algo mutilado.

    A música, em geral, é mais acessível do que as outras manifestações culturais, ou será mesmo que na última exposição das obras de Caravaggio em Brasília, houve uma presença considerável de pessoas que nem se quer jamais ouvirá falar deste pintor? Será mesmo que eles estão tendo uma experiência realmente regozijante das obras do referido pintor apenas com o que lhes é apresentado naquele momento? É aconselhável dizer a alguém para ler Shakespeare nas traduções da Martin Claret, e tão somente com a leitura destas traduções, dizer que será proporcionado a ele uma experiência poética grandiosa?

    Por fim, esta argumentação de Sandow de que a música clássica está alheia às mudanças culturais do seu tempo é insustentável, para não dizer pior, pois, o que dizer então dos interpretes que se empenham, estudando com afinco as obras e tentam trazer interpretações mais minuciosas e, que na sua visão, podem ter sido assim concebidas pelos compositores. O que dizer das performances historicamente informadas? Eu sei, eu sei, ele está tentando falar de conduta por parte do público, mas este, em determinados núcleos já não compartilham da mesma visão do público de antigamente, veja-se que tratar de negócios, galanteios e falatórios não são mais bem vistos em salas de concerto.
    Este talvez seja o meu problema com Sandow, o argumento dele é refutável demais. Há de se notar que as outras manifestações artísticas estão mais próximas do cotidiano, do corriqueiro, vide “La Gioconda” estampada em bermudas com óculos escuros e um sorriso insípido.

    Arrastar para o cotidiano, rebaixar até o ponto de nem sequer podermos usar a expressão deturpada, pois ficaria contraditório o uso desta com a situação é muito discutível.

    Porque não apoiarmos as propostas de “educação” musical proporcionadas por algumas orquestras?
    Concertos gratuitos, “et cetera”?

  28. Diego,

    Quanto aos aplausos do público, não se falou de nenhuma proposta que anarquize os aplausos do público em todos os concertos do mundo. Como eu havia dito, diferente da sua crítica geral, não se trata de uma ideia sem contexto – afinal, é algo que precisa ser feito com inteligência pra fazer sentido. A ideia de que eu falei era simplesmente a da promoção de um concerto em que o público foi informado sobre o contexto da Sinfonia Paris de Mozart que seria apresentada naquele dia, sobre a carta em que o compositor expressou a sua expectativa para que o público fosse surpreendido e entusiasmado em tais e tais passagens da obra e que fosse levado justamente a aplaudir em reação a elas, e que no concerto em questão a mesma liberdade seria experimentada. Ou seja, é uma ideia e uma proposta específica e contextualizada. Mas veja que o seu próprio reflexo pessoal em defender a música clássica contra essa ideia, como se ela fosse uma ameaça generalizada e não apenas uma ideia, é exatamente aquilo pra que eu chamo a atenção quando comparo a música clássica com outras artes: temer algo tão simples em uma experiência espontânea com o público como se a imagem da música clássica fosse tão frágil a ponto de poder ser perigosamente alterada (mesmo em um nível ideológico, como você diz) é ou uma situação reveladoramente frágil mesmo (!) ou um grande exagero.

    Quanto à comparação com outras artes nesse mesmo sentido, em que ideias e propostas específicas de apreciação não me parecem ser recebidas como uma ameaça tão grande à disponibilidade dessas artes, eu não quis dizer que a recepção de outras artes não pode ser criticada, é claro que pode e deve! Não há estado acabado na interpretação e na contemplação de arte alguma, o que é justamente o que as torna tão desafiadoras e tão fascinantes para todas as épocas. Por isso problemas como o das traduções, que você mencionou, não interferem nesse sentido específico de que eu dizia: a apresentação hoje de uma sinfonia de Mozart em que se permita ao público aplaudir quando quiser, exatamente como acontecia na sua própria época, parece poder ser recebida por parte do público especializado com muito mais alarde e decadentismo do que a apresentação de um soneto de Shakespeare em um rolo de papel-higiênico ou a sua incorporação no samba-enredo de uma escola de samba. Isso não quer dizer que essas apresentações e mudanças de suporte e leitura na poesia não possam ou não sejam criticadas, mas proponho que não o sejam com a mesma sensibilidade provinciana na música clássica atualmente, o que me parece obviamente revelador. É por isso que uma tradução esdrúxula, como você mencionou, deve mesmo ser criticada e faz parte da crítica literária, mas isso não vai contra essa comparação entre a sensibilidade da disponibilidade da poesia e a da música clássica diante de propostas às vezes tão simples.

    Por fim, quanto à crítica do Sandow sobre a distância da música clássica em relação à cultura do seu próprio tempo, acho que você não compreendeu essa ideia. Ele não quer dizer simplesmente que a música clássica não é tão “popular” quanto outras artes, e sim que ela está muito mais desligada da história presente mesmo – a arte que reflete o significado das reconfigurações políticas, sociais, culturais e históricas do séc. XX parece não ter na música clássica a sua representação mais emblemática no referencial cultural das pessoas até hoje, diferente das grandes obras da literatura e das artes plásticas que vêm traduzindo o mundo desde então, que, veja bem, tornaram a realidade mais pensável para o mundo. O estudo que um intérprete faz de uma partitura não tem absolutamente nada a ver com isso. Eu sugiro que você dê uma lida melhor nessa ideia do Sandow.

    Essas ideias têm muito pra serem discutidas e eu já tenho muitas coisas anotadas por aqui, tanto dos prós quanto dos contras. Tenhamos fé de que a minha resenha possa ser postada em breve!

  29. Penso que a Música Clássica é como um diamante de excelente peso, feito a duras penas, através de séculos de pressão. Foi resgatado das profundezas, cuidadosamente lapidado, engastado em ouro, posto à mostra sobre um bom veludo purpúreo, debaixo da mais pura luz. Nenhum diamante é pop, nem tampouco fica exposto fora de seu contexto para tornar-se socializável, democraticamente acessível, e coisa e tal… Se a música clássica for mesmo importante, verdadeira, honesta, certamente irá preferir seu próprio óbito a ver as condições sociais, políticas e educacionais de quinta categoria forçando a barra para que deixe de ser gema de alto quilate para tornar-se um “pé de couve” ou coisa que o valha! Detalhe: Um diamante é para sempre. Já um “pé de couve” …

  30. Leonardo,

    Depois de um hiato e de avaliar algumas coisas, cheguei ao seguinte ponto:

    Sandow está realmente equivocado. Afirmar que a música clássica está alienada das conjunturas políticas, sociais, culturais e históricas, por assim dizer. Afinal, temos John Cage, Berio, György Ligeti, Stockhausen e demais até desconhecidos, que sinalizam para uma música clássica que abarcam os fatores supracitados, é um grande equívoco.

    Temos, mesmo embora não se enquadrando no conceito mais usual de música clássica, mas que poderíamos denomina-los de possíveis vanguardistas, os compositores que se utilizam de instrumentos tradicionais europeus para composições musicais para o Cinema. Nessa esteira temos uma mistura de formas anteriores ao séc.XX para uma manifestação cultural genuinamente do séc.XX, o Cinema.

    Todos estes compositores (os vanguardistas mesmos), de uma maneira ou de outra estão ligados às conjunturas do seu tempo. Contudo, o paralelo de quanto cada campo das artes está para o seu tempo (no sentido até agora trabalhado), não é na maioria das vezes avaliado com seriedade. Veja-se, por exemplo, no campo das artes plásticas, a pintura chega, realmente a abarcar o absurdo da pós-modernidade (sic). Picasso, Much, e tantos outros, trazem para dentro de suas obras as caratecterísticas (em sentido amplo) do seu tempo.

    Mas e a música clássica? Ora, se nas obras dos compositores acima citados não conseguimos identificar essas características é por que há algo errado com a nossa percepção. Vejam-se as composições, no campo da música eletrônica produzida por Berio e Stockhausen, veja-se as absurdas (não no sentido valorativo) das composições de Cage.

    Agora, se as composições com que os ouvintes, em termos quantitativos, estão expostos são refletores das circunstâncias históricas, sociais, culturais e etc, é algo muito discutível, em termos de validade mesmo. Afinal, transformar manifestações culturais em “diários públicos” não é algo que os torne válidos, nas questões acima expostas.

    Assim, se considerarmos estes fatores acima discutidos, quanto à falta de seriedade quando o assunto é música clássica e o seu tempo, temos que toda a discussão anteriormente levantada, sobre mudanças de comportamento no sentido de que fala Sandow é infrutífera.

    Se ele falha na hora de avaliar estes parâmetros, consequentemente as suas propostas também serão falhas.

  31. Diego,

    Não é que a música clássica contemporânea não reflita em absoluto o seu próprio tempo – isso seria até mesmo impossível -, mas é que houve de fato um divórcio entre a música clássica e a cultura a que até então ela pertencia e traduzia enquanto voz presente e confiada em seu valor. Um exemplo: quanto da música de Beethoven não reflete a transição da era moderna para a contemporânea, Napoleão Bonaparte, o Aufklärung, a noção romântica de indivíduo? Me parece que muito. Agora, quanto da música clássica contemporânea reflete a década de 60? Sandow falou sobre isso aqui, comparando com o que acontecia no cinema: http://euterpe.blog.br/boulez-e-godard. E de fato, descontando a instrução que as pessoas teriam para apreciar Boulez, mesmo assim não me parece que a música clássica desde a II Guerra Mundial esteja tão próxima de traduzir o mundo presente – ela se coloca muito mais à parte, e aquele espaço de dar voz para a experiência de uma cultura é ocupado cada vez mais pela cultura de massa. É certo que todas as artes sofreram isso, mas de longe a música foi a que mais sofreu, o que me parece explicar o porquê das pessoas em geral acharem que a música clássica é apenas um estilo de música, e não um gênero contendo vários estilos e uma longa história (um post sobre isso: http://euterpe.blog.br/musica-e-cultura/musica-classica-um-genero-um-estilo-uma-prateleira-de-cds).

    Então acho que o Sandow tem sim razão ao apontar essa crise, esse distanciamento da música clássica contemporânea. E as propostas dele são inteligentes e flexibilizam a presença da música na nossa cultura, então poderiam ser experimentadas sem fobias.

    Agora, é verdade que traduzir a cultura presente pode ser apenas um critério para o juízo de valor da música sendo produzida. Eu ainda estou pensando em como resenhar toda essa questão, que é complexa, mas quando decidir pretendo falar sobre isso também.

  32. Diego,

    Só para esclarecer ainda mais, o próprio Sandow responde seu último comentário neste trecho: “Eu disse que Boulez, o principal músico de vanguarda nos anos 50 e 60 na França, não fazia parte da mudança cultural que estava acontecendo lá. Mas Godard, um dos principais diretores, fazia parte dela profundamente. E eu mostrei o porquê. Meu ponto, no entanto, não era dizer que a música clássica precisa estar na vanguarda da mudança. Ao invés disso, ela vai cair por todo o espectro da mudança, assim como qualquer outra coisa. Havia vários filmes saindo em Paris ou Hollywood nos anos 60 que eram completamente convencionais. Assim como vários livros, pinturas, poemas, peças, o que fosse. Meu ponto, ao invés disso, era ilustrar uma falha (conforme vejo) da música clássica em nossa era, em que quando a cultura muda, a música clássica não toma parte nessa mudança. Salas de concerto não refletem as mudanças da cultura (como as salas de cinema – mesmo aquelas mainstream nos EUA – rapidamente refletiram, uma vez que a revolução dos filmes dos anos 60 se instalou). E, mais importante, as pessoas envolvidas na nova cultura não encontram muito na música clássica que tenha a ver com elas. Então elas se voltam para outras artes, e para a cultura popular”. Daqui: http://euterpe.blog.br/programando-para-um-novo-publico-um-exemplo.

  33. Aos que acompanhavam a série: escrevo apenas para avisar que todos os textos do Sandow que eu pretendia trazer para o blog foram enfim traduzidos. Estou abrindo caminho para um post de resenha dessa proposta.

    Abraços!

  34. Putzgrila, tenho 60 anos e ouço música “erudita”(aspas para ser politicamente correto) há 50 anos. Nunca pensei que a arte devesse refletir o seu tempo ou o seu lugar, ou a “sua naçao”, ou qualquer coisa sociopolítica. Ela nunca precisou refletir, por isso ela existe…
    Música “clássica” é universal e intemporal, nao é trilha de novela. Tivéssemos de repetir, é esse o verbo, nossa realidade, ainda mais no Brasil, tudo seria carnaval, como é. Tivessem os europeus de ser “atuais”, não teriam sempre estudado Homero, Cícero, Camões, Goethe, Wagner e Nietzsche.
    No Brasil, há apenas medo de ser “europeu”. No mundo, há marketing imediatista, lucro rápido, público quantitativo.
    Magnífica,poderia ser menos elegante, a matéria de Leonardo sobre Andre Rieu e sua desonestidade.
    Entrei nesse Blog hoje. Nem sei se ele ainda existe; Só vejo artigos de 2012.
    Qual é a crise? Mesmo com acessibilidade via internet,a civilização “clássica” está acabando, sim. Tanto que precisamos colocar aspas em tais adjetivos. E precisamos, cheios de vergonha, falar pisando em ovos…

  35. Desculpem, vi agora que,nas primeiras colunas, há vários artigos de 2014. Todos guardam alta erudição, conhecimentos profundos, pesquisa e paixão pela música. A existência deste Blog é o que de mais gratificante eu testemunhei no Brasil inculto e belo. Nem tudo está perdido. Porém ,continuo pensando que a crise cultural, em nosso país, tem tudo a ver com a popularização compulsória da política oficial, a massificação pedestre das mídias,e, no caso da música clássica ,uma insidiosa eurofobia.

  36. Caro Flavio,

    O Greg Sandow, nessa longa série de textos que foi trazida para o blog na lista dada por este post, fala como um marketeiro tentando salvar as orquestras americanas de uma crise comprovada estatisticamente, mas a grande questão desse tratamento marketeiro da música clássica é se ele é mesmo o “melhor” para ela: afinal, por que é que a música clássica precisa refletir o nosso tempo?

    Mas antes de concordar com você, eu preciso dizer que a reflexão sobre essa chave – sobre a música clássica refletir o tempo presente – me fez perceber coisas que eu nunca tinha percebido. Porque de fato, se há uma diferença da música clássica há cem anos e hoje, é que ela já foi, sem constrangimento, a voz da humanidade a partir do seu próprio tempo, e, diferentemente de hoje, ela tinha o seu valor reconhecido pelas pessoas dessa maneira. Não importava se Debussy era coisa de minoria burguesa ou aristocracia decadente, no seu próprio tempo ele ainda podia ser reconhecido como alta cultura falando profundamente do seu próprio momento para toda a história. E foi a partir desse poder, daquilo que a gente aprendeu a chamar de “porta voz” de um momento histórico, que a música clássica parece ter alcançado a sua universalidade: quando Beethoven escreve música influenciado pelo abalo às instituições estabelecidas do seu tempo – a Igreja e a Nobreza, ameaçadas pela Revolução Francesa e por Napoleão -, é a sinceridade com que essa música expressa o ser humano nessa experiência histórica o que torna a sua arte tão profundamente universal, porque houve uma linguagem particular para captar vivamente essa essência universal. Parece que hoje nós perdemos isso na música clássica, talvez justamente por medo de não sermos “universais”, ou por medo de refletirmos uma realidade indesejável, como você expõe compreensivelmente sobre a nossa cultura.

    De todo modo, tenho planos de resenhar esta série do Sandow, e também planos para um post sobre esta dinâmica de particular x universal, que tem sido pertinente nos seus últimos comentários.

    Um grande abraço!

    Leonardo

  37. Eu escuto música popular e clássica desde criança, aprecio igualmente ambas. Só que música clássica mesmo dá pra dizer tranquilamente que “escuto gente morta”. O único compositor vivo que me deixa fascinado desde os cinco anos de idade é Hans Zimmer, desde quando ele fez O Rei Leão e eu nem sabia o que era “trilha sonora” naquela época.

    Afinal, onde estão os compositores de hoje? A música, a arte em geral, precisa de nomes que sejam associados a uma inovação ou a um passo grande. Mozart não se tornou famoso à toa. Bach, Villa-lobos, todos eles tem o nome associado a um tipo de música.

    E quanto aos vivos?

  38. Mat,
    A música clássica, ou erudita ,ou culta não está morta e existem vários compositores vivos. Hoje temos outros apelos comerciais para o entretenimento “gregário”. ^Claro que a criação de óperas ainda existe, mas com muito menos mercado do que no século 19 na Itália.
    Em termos de música de concerto, o repertório apresenta mais autores mortos do que autores vivos e isso foi sempre assim. Diz-se que o bom artista está á frente de seu tempo e somente será compreendido por gerações seguintes. Isto não é ,porém ,tão matemático. Inclusive, tal “tradição” pode ser usada por artistas charlatães que vendem suas peças ruins sob o pretexto de que a posteridade as valorizará. O fato de termos muitos antecedentes nesse sentido não legitima qualquer delírio vanguardista.
    Depois, temos a questão da modernidade, a ânsia por novas escolas ,o vanguardismo compulsório, ou a necessidade de refletir a realidade atual….Esta, creio eu, está ,em todo o mundo e todas as artes, menos clássica, ou exigente, ou profunda, e bem mais lúdica, consumista, massificada. Não vejo, p.ex., em literatura e artes plásticas , uma busca por valores “elevados”, ou por “refletir-denunciar” o mundo atual.
    Temos que lembrar um aspecto: as pessoas exigentes, “clássicas”, estetas, letrados, “elite intelectual”…sempre foram poucas. E o gozo maior que existia sobre as artes “clássicas” era no reino íntimo, muitas vezes provinciano, bibliotecas e discotecas domésticas. Acho que nunca um erudito foi aquele cara que pode fazer um discurso á vontade num aniversário com 50 pessoas.
    Mas tudo está menos clássico-erudito ,sim. Privilegiam-se trabalhos acadêmicos, universitários, diplomas (nada contra) que gerem resultados financeiros, assim como a mídia propulsiona diversões cada vez mais pedestres, efêmeras e rentáveis. Os esquisitos que amam clássicos continuam quase envergonhados em seu canto sem parceiros. Por um lado, um pouco pior que antes; por outro, melhor graças á internet.
    Quanto aos compositores , vivos e mortos, do último século, os compêndios salientam os que abriram novas escolas , como Schoenberg, Webern, Cage, Stockhausen, Boulez, Berio, muito mencionados nos comentários acima.
    Este tipo de vanguarda musical , que permanece indigesta e caótica para grande parte dos melômanos diletantes, representou, sim, em alguns momentos ,a sua época , como a Nouvelle Vague no cinema. Partiram para maior exigência na música exigente. A aceitação deles foi muito estratificada. No fim do século XX, isto desembocou nos minimalistas, como Part, Gorecki, Tavener, Newman , Glass, os quais,quase todos vivos, numa reação à complexidade ou audácia em que se encontrava a “vanguarda”, pularam para uma simplificação quase monótona. Estes são compositores vivos e ISTO REFLETE a nossa atualidade simplista.
    Houve ,no século XX , grandes autores na “Cortina de ferro”, como Szimanowski, Shostakóvitch e Prokófiev, que refletiam de certo modo sua realidade”socialista”, eram considerados retrógrados pelos modernos “ocidentais”, porém foram mais exigentes do que os minimalistas de hoje.
    Não esqueçamos ,também,que R. Strauss morreu em 1949 , como pós romântico, sendo suas óperas ainda hoje consideradas pesadas por meio mundo.
    Também da URSS (não sou comuna,nao, mas respeito diversidades) veio o fabuloso poliestilista Alfred Schnittke.
    Enfim, os autores não morreram todos ,nunca deixaram de existir em diversos estilos simultâneos. E nem Mozart ,em seu tempo , foi pop star.

  39. O comentário de MAT é pertinente no sentido da maior “ausência” da música (ou arte) clássica em nosso cotidiano.
    Quando ele pergunta onde estão os compositores atuais “nao pop”, ele deduz ,talvez, que os “antigos” clássicos tivessem sido expressão artística e mercadológica em sua época.
    Primeiro: a maior parte dos artistas vivos(no sentido artístico e não biológico) , se grandes, não tiveram ,em vida biológica,o devido reconhecimento, mas ficaram “vivos” postumamente. Recíproca inverídica.
    Segundo: a maior parte dos artistas que logravam transmitir apenas o espírito de sua época, em música, tornaram-se, artisticamente, mortos. Não atingiram universalidade. Ao mesmo tempo, Bach,Handel, Haydn e Mozart não inauguraram uma escola, mas enriqueceram um estilo existente. Não procuraram a “sua atualidade”,mas algo universal dentro da linguagem atual.
    Terceiro: as inovações são necessárias , mas tb podem ser abrigo para o charlatanismo, no sentido “Inovo, logo ,sou genial”. Isto tb não significa q todos os inovadores sejam ineptos. Antes de suas “diatribes”, Picasso provou que sabia pintar de modo romântico. Antes do dodecafonismo,(eu o detesto), Schoenberg nos provou capacidade lírica em Gurrelieder e Noite Transfigurada.
    Quarto: As enciclopédias nos dirigem ao que é Arte Moderna, mas nós deveríamos nos referir, ouvir, ler, curtir, julgar, abominar, abraçar, mais por experiência (auditiva no caso da música) do que por estudos acad~emicos.
    Então, o pensamento de MAT sobre ausência de ícones midiáticos em música erudita faz sentido na presunção DELE ,de que Bach teve em vida o êxito de Ivete Sangalo, ou na presunção- compreensível- de que teríamos de ter hoje compositores eruditos com a mesma difusão de , digamos, Chopin. Falo Chopin de Paris, em vida……

    De outra parte, há ,sim, veracidade na vertiginosa perda de espaço para tudo o que for clássico, não apenas música. Isto se deve “apenas” ao Mercado….e a políticas populistas.
    Mas, felizmente, ainda há alguns artistas clássicos ,biologicamente vivos, assim como há outros mortos porém artisticamente vivíssimos.
    No séc XX, eu lembraria, fora da esfera modernosa , R Strauss, Nielsen, Busoni, Roussel, V Williams, Walton, Simpson, Wellesz, Bax, Falla, Bloch, Silvéstrov, Ibert, Stravinski, Bartok, Kodaly, Prokofiev, Shostakovitch, Miaskovsky, Lutoslavsky, Penderecki,,Hindemith, Korngold, Carter, Copland, Mignone, Ginastera, Poulenc, Harris, Hanson, Tippet, Britten, Henze , Martinu, Panufnik e outros.
    Temos muitos carnalmente vivos, principalmente na escola minimalista. Enfim, recursos “mínimos” nos consolam em tempos de caça às “elites”

  40. E nao podemos nos esquecer de Penderecki, que ainda vive, cria, comverso com a filha dele toda semana pelo WhatsApp…

  41. Não li os textos de Greg Sandow e talvez eu esteja chovendo no molhado. Lembrei um fenômeno que sacudiu e talvez derrubou a cultura artística em meados do séc XX: A Televisão.
    Quando eu era criança, meu pai ouvia discos clássicos ou rádios argentinas todas as noites. Nos anos 60, veio aqui em Santa Cruz do Sul a primeira Torre Repetidora de TV. A partir daí, só se pensava em música quando a TV estivesse fora do ar. Até hoje ,conteúdos clássicos só temos em canais educativos e, na TV a cabo, só conheço o Arte 1.
    Há uma queda de interesse,sim, por arte e cultura. Muita gente só “curte” o que encontra eco social, ou seja, possa compartilhar com outros. Muitos olham novela por esse motivo.
    Artistas e compositores clássicos ainda existem, sem dúvida em menor quantidade “per capita”.
    Quanto à relação entre a atualidade e a arte, acho a coisa muito complexa. Percebemos um ideal republicano em Beethoven, ou um germanismo prolixo e bismarckiano em Wagner,com óperas de 4 horas, encenadas em 7 horas para uma burguesia desocupada. Mas muitos compositores deixaram uma ótima obra que não saberíamos a que associar.
    Vender arte ,ou um artista viver de suas obras…depende ,sim, da procura e interesse por parte do mercado consumidor. Isto deve ter sido maior no passado, sim, ainda que Haydn e Bach fossem empregados sem direitos trabalhistas.

  42. Quanto a música clássica atual, acho que estão muito presos a forma. Existe música erudita sem cordas e metais, sem ternos e teatros, sem a plateia em silêncio absoluto? Se eu adaptar uma música midiática como Beatles para orquestra ela continua sendo midiática ou vira outra coisa?

    Transformaram a orquestra num tipo de instrumento coletivo que soa sempre da mesma maneira. A música erudita mudou muito ao longo do tempo, com a evolução dos instrumentos. Não fosse essa evolução a música teria parado nas composições para o barroco. Mozart teria passado a vida tocando Bach, estudando cravo, elogiando os genios da música barroca do passado, e muito enjoado para experimentar instrumentos metálicos e outras coisas de sua época.

    Olha quantos instrumentos modernos foram ignorados pelos compositores *biologicamente vivos de hoje, que se apegaram aos formatos de 1800. Nunca vi uma composição atual usar guitarra elétrica com overdrive, wah e sintetizador, salvo alguns experimentais e criadores de trilhas para filmes americanos. Algum deles já usou por exemplo o idiofone alemão recente chamado Hang?

    Sabe uma coisa que seria o equivalente moderno dos canhões que Tchaikovsky usou na Abertura 1812 (que, aliás, ficaria um espetáculo digno deste século)? Bobinas Musicais de Tesla. Música produzida por faíscas de altíssima voltagem. Seria épico.

    Mas os compositores de hoje me parecem parados no século XIX, presos ao mesmo formato, aos mesmos instrumentos. Hoje um adolescente com computador consegue sintetizar uma orquestra inteira por meio de MIDI. Como que os compositores profissionais de nossa época ignoram tal tecnologia?

  43. Neste post, até o dia em que eu retomar o assunto e escrever uma resenha, tenho deixado os leitores mais à vontade no campo de comentários. Mas têm surgido questões bastante complexas que eu vejo que, para serem tratadas de maneira melhor acabada, ainda que de modo sumário, mereceriam um grande espaço e muitas contextualizações – como a questão da origem do repertório padrão e a sua manutenção nos séculos XX e XXI, que surgiu nos últimos comentários e é sensível a muitos fatores.

    Mas respondo apenas particularmente ao mat que: enquanto estivermos aqui esperando pela propaganda (via marketing das gravadoras?, via artigos de jornal?, via relações públicas com celebridades?, via divulgação acadêmica?, via redes sociais?) do grande compositor da nossa era, inúmeros festivais de música contemporânea estão acontecendo pelo mundo todo, alguns inclusive no Brasil, nos quais ideias como o uso de tal ou tal instrumento, que para nós poderia parecer incomum em uma obra que dispute lugar em uma tradição erudita, são há muitas décadas algo banal.

    Ou seja, do mundo real até os manuais de história até a nossa fruição segura há um longo caminho, e, enquanto isso, não ouviremos falar do que é feito na música contemporânea em programas de auditório brasileiros, mas pesquisando ativamente.

    Do que você menciona, guitarras elétricas são usadas na música contemporânea há décadas (os exemplos são fáceis e inúmeros desde os Gruppen de Stockhausen nos anos 50, mas cito apenas este: https://www.youtube.com/watch?v=75Dqh5PWbWo), assim como bateria e música eletrônica da mais complexa (Varèse MORREU nos anos 60) – tudo não recentemente, mas há décadas e copiosamente. Quanto a recursos mais recentes, não vou procurar agora, mas é muito fácil imaginar que algum compositor já pode tê-lo utilizado, não soa para mim em nada desafiador questionar se a música contemporânea já pensou em algo tão simples.

    Por isso eu o incentivo muito nessas suas reflexões, mas saiba que a música contemporânea, como os colegas acima também anunciaram, já foi muito além dessas questões desde há décadas, o que na verdade é muito animador.

  44. “Existe música erudita sem cordas e metais, sem ternos e teatros, sem a plateia em silêncio absoluto?“

    Prezado mat: a pergunta acima nos revela que vc não assiste com muita freqüência a concertos de música contemporânea. Mas suas perguntas revelam tb um interesse legítimo e elogiável sobre diversos temas muito importantes para nós todos. As respostas que recebeu vão certamente ajudá-lo muito no que vc procura. A elas, gostaria de acrescentar umas poucas linhas.

    Para termos música, é necessário um emissor (instrumento, voz, etc), um meio (ar, ondas de rádio, arquivos digitais etc) e um receptor (nossas orelhas, cérebro e –por que não?- coração).

    Quando vc pergunta onde estão os compositores vivos, a resposta é: esses emissores estão aí, trabalhando, produzindo e mostrando suas obras pra quem quiser ouvi-los. Nunca houve no mundo tanta gente tão bem preparada para compor música chamada erudita quanto hoje. E se considerarmos que grande parte desses compositores dispõe de instrumentos (acústicos, eletrônicos, digitais etc) para mostrar e vender seu peixe, a próxima pergunta é: Mas por que não se escutam essas obras?

    A resposta: porque aparentemente muito poucos querem ouvi-las. Ou seja, existiriam poucos receptores para essa música. Pelo menos, é essa a conclusão tirada por aqueles que controlam os meios (internet, midia, política, etc), e que deles procuram tirar o maior proveito possível.

    Antigamente muitos entre nós vivíamos sob o medo da ditadura do proletariado. Hoje temos que suportar a ditadura dos que controlam, manipulam e ganham dinheiro com nosso gosto musical. Se Mozart hoje vivesse, teria o mesmo problema de um Shakespeare ou Picasso: afundaria na mediocridade da ditadura estética vigente.

    Mas este blog e suas perguntas são a prova de que há mais gente interessada em música de qualidade do que nossos ditadores acreditam. Um abraço.

  45. Concordo com Monteiro. Quero dizer que li todos os ensaios de Greg Sandow. Com efeito, há muitas ideias interessantes sobre (des)construir o público para artes clássicas.
    Ele fala nos anos 60 e 70….quando a música clássica ainda tinha público fiel. Isto pode ser, em parte, veraz porquanto a televisão ainda não imperava. Doutro lado, foram os anos áureos da música popular: Elvis, Nat Kg Cole, Rock, Beatles, Bossa Nova e a boa MPB. Nunca Mozart teve tantos concorrentes, hoje resumidos aos sertanejos paulistas.
    Então,nos 80, surgem repertórios de concerto que desejam atrair com obras menos antigas, acabando em arranjos de Roberto Carlos, ou trilhas no estilo Guerra nas Estrelas. Tudo para evitar a “sacralização” dos “arcaicos clássicos”.
    Seriam os antigos o problema?
    Jovens que tiverem apetite clássico ou artístico (deveria por isso entre aspas?) decerto admirarão a arte intemporal e antiga.
    Não penso que o descaso esteja na obsolescência do repertório. Ou que devamos trazer aqueles minutinhos de Webern “que ele pretendia dançantes”. Ou apresentar os silenciosos 4.33 de Cage como chamarisco moderno.
    A meu ver, aí está um dos erros.
    Passando às artes plásticas, os 4.33 de Cage equivalem a uma tela branca. Sei, pode haver quem chore de emoção ante uma tela branca ou uma cadeira queimada. Nas Bienais, muitas instalações “futuristas”, ofensivas a qualquer critério, encontram acólitos que se querem passar por sensíveis.
    Nada causam, todavia, de artístico e duradouro tais ensaios, eventualmente incentivados pelo poder público.
    Aliás, aqui vale lembrar que a cultura regulada pelo Estado gerou,por um lado, direcionamentos abjetos, mas, por outro lado, sustentabilidade que a iniciativa privada não protege. Ingerência de estímulos estatais pode ser tão deletéria quanto pode ser necessária.
    Em 1988, assisti, em Koeln, a uma estreia de Stockhausen em que o piano era tocado com o traseiro da pianista. Não faltariam críticos de minha estupidez que não compreende tal transcendência.
    Enfim, estamos demasiado polarizados entre “atual” ou”antigo”.
    Penso que a crise na música e artes clássicas NAO se deve à FALTA, mas ao EXCESSO de modernidade.
    Na área da pintura, também há menos público para o acad~emico-romântico ou para o “visionário”, e muito mais aceitação do meio caminho “abstrato”.
    Versões irreverentes da Italiana na Algeria, ou “Indes Galantes” são benvindas porque equilibradas entre céu e terra.
    Não entendi, em Sandow, que os clássicos devessem se estender “tão longe quanto a música pop e as artes plásticas”. Talvez pudéssemos trocar a expressão para “tão perto”…
    O afastamento da juventude a toda forma de arte, não apenas musical, se deve ao lucro midiático dos modelos imediatistas.
    Não concordo sobre o sucesso de Godard contra o insucesso de Boulez. Foi uma época de hermetismo compulsório, que passou para Godard , Boulez e para o mundo.
    Eternos são os antigos? Muito provavelmente. E não é a “antiguidade” que afasta os clássicos.
    Tudo reside em patrocínios e lucros rápidos. Uma ópera faz cinco récitas, enquanto um musical fica na Broadway 5 anos porque as mensagens fáceis e vendáveis são bancadas.
    Nada mais do que isto!
    E não queiram trazer aos concertos Anton Webern e John Cage. Seria a pá de cal.
    Entre Vivaldi e Hindemith, ou entre Debussy e Xenakis, há muitos a meio caminho.
    Os jovens desconhecem Beethoven e amariam Tchaikovsky. O resto é mercado, máfia e mídia.

  46. Tenho minhas dúvidas se realmente o público jovem não tem interesse por música clássica em geral.

    Eu mesmo tenho 22, escuto de tudo e conheço muitos outros jovens que gostam de clássicos como Mozart e Wagner. Normalmente pessoas de minha idade que cresceram em zonas urbanas, criados pela TV, assistiram repetidamente na infância os cartuns da era de ouro. Podem não saber por nome, mas eles tem um estalo de nostalgia ao escutarem, por exemplo, Hungarian Rhapsody N.2 de Liszt ou a abertura de Barbeiro de Seville. As vezes deixo tocando essas e outras em casa e no celular, sempre falam sobre elas. Os cartunistas dessa época, Disney, Lantz, Hanna-Barbera eram grandes admiradores de Stravinsky, Mozart, Liszt, enfim, uma gama de compositores bons.

    Música clássica só não se escuta mais por falta de indicação. Um artista ganha notoriedade entre pessoas jovens, pela internet principalmente, depois que algum formador de opinião comenta sobre ele, ainda que brevemente. No caso de clássicos, há potencial de crescimento muito mais rápido. Hoje existe público de 18 anos para músicas de 50-60 anos por causa disso. Não é tão incomum por exemplo ver um jovem escutando Louis Armstrong e Ella Fitzgerald, ou Tom Jobim.

    E não faltam referências. Por exemplo um album recente de Tarja Turunen chamado My Winter Storm fez uma série de citações de Mozart em suas músicas, inclusive Introitus de Requiem na primeira faixa. As pessoas coletam essas referências fragmentadas na cultura pop e pesquisam sobre o assunto. Quando se trata de indicação por formadores de opinião, o interesse acontece ainda mais rápido.

    Muitos canais no YouTube tem feito esse trabalho de referência a música clássica, como ThePianoGuys, que fizeram releitura do começo da Suite de Cello de Bach, vídeo com 14 milhões de visualizações. O cinema também desperta o interesse de muitos ao fazer citações, por exemplo o filme Sherlock Holmes: Game of Shadows destaca Don Giovanni. O último longa metragem do Mr. Bean tem também uma cena em que ele interpreta Rondo Alla Turca e Mio Babbino Caro. No YouTube essa cena tem mais de 90 mil visualizações e nos comentários as pessoas perguntam o nome das músicas.

    A arte lixosa dessa nossa epoca no Br interessa a muita gente, mas não é uma parcela tão grande de público quanto a televisão quer nos convencer. Hoje, com a internet, bandas e músicos “indie” que fazem distribuição quase artesanal de seus discos sobrevivem muito bem na internet.

    No caso do Brasil, faz falta um compositor como Tom Jobim, que consegue ser popular e fazer música de alta qualidade ao mesmo tempo. Como existe tanta falta, existe mercado de sobra. Quem quer que se atreva a compor para o grande público, público jovem, obras de qualidade, tenho certeza que vai se dar bem.

  47. Mat, suas observações foram maravilhosas…adorei…e com detalhes…muito bem…mas, como sempre, os eruditos de plantão irão destruir seu texto, apontar erros e jogar um belo balde de água fria em sua boa vontade…já tem poucas pessoas que, assim como eu ou você, se interessam por música erudita, ainda quando encontramos um cantinho quentinho e agradável como esse, surge os eruditos de plantão, falam mais bonito que você, conhecem mais que você e – o que é pior – te derrubam…destroem todas as suas idéias…ai dá vontade de ficar calado e não se manifestar mais…é o que eu faço…mas, parabens e aplausos….

  48. Caríssimos,

    Vamos todos nos concentrar no plano das ideias? São todos muito bem-vindos, não há motivo para ressentimentos, mesmo diante de discordâncias.

    Faço meu apelo, quase subjetivo mesmo, apenas para tentarmos todos ser mais objetivos neste debate, esforçando-nos por resumir nossas ideias pontualmente e em apenas um comentário, para não haver nenhuma sensação de “avalanche” de comentários que deixe outros leitores indispostos a discutir, já prevendo a canseira de, a cada coisa dita, ter que ler tantas avalanches textuais a cada réplica e tréplica em seguida.

    Sobre a questão atual, do interesse dos jovens por música clássica, eu menciono apenas dois pontos para reflexão: 1) algumas vezes, medir a presença dos clássicos na cultura popular pode ser ilusório, como dizer que Harry Potter forma leitores de Shakespeare apenas porque traz a vantagem de formar leitores. Ou seja, uma coisa não tem nada a ver com a outra, e citações esporádicas dos clássicos na cultura pop sem qualquer contextualização não trazem por si só nenhuma mudança nas pessoas – em suma, não se pode chegar ao ponto de esperar que essas citações descontextualizadas cumpram a função formativa e educativa que outros meios não estão cumprindo. Mas claro que compreendo que esse intercâmbio pode criar ganchos para aqueles que poderiam se interessar pelos clássicos, trata-se de uma dessas felizes coincidências da vida. 2) Dependendo do meio em que estamos, podemos suspeitar que os frutos mais duvidosos da indústria cultural não têm um apelo tão abrangente assim, e que, como nossos amigos todos não assistem ao programa da Regina Casé na televisão, há certo exagero em se queixar desses produtos da cultura de massa em detrimento de uma alta cultura (o que de todo modo costuma ser apenas uma abordagem histérica mesmo). Mas se é verdade que o nosso meio, com nossos amigos, pode ser uma amostragem de que não falta gente para apreciar cultura “a longo prazo”, o fato é que demograficamente há sim muita gente, uma verdadeira maioria, para sustentar “fenômenos de massa”, e é por isso que ele tem esse nome. Há, enfim, muita gente no país, muito mais do que poderíamos imaginar apenas pelos contatos que temos com nossos amigos e conhecidos.

    No mais, concordo com o comentário de incentivo do mat.

    Abraços!

    Leonardo

  49. Obrigado, Denilson.

    Hoje há um potencial que nunca houve, a música clássica pode alcançar bastante público, até formar uma expressiva comunidade de culto ao redor de compositores antigos e contemporâneos. A pergunta é: será que é isso mesmo que os músicos, compositores e apreciadores querem? Quando isso acontece com uma obra de arte, dizem que vira “modinha” e cai na categoria de cult.

    Em outras artes esse tipo de coisa já aconteceu. No cinema, por exemplo, diretores de estilo único e pouco comercial, que por muito tempo foram de filmes B, com baixo orçamento e pouca repercussão alcançaram notável culto, e viraram modinha, como dizem. Quentin Tarantino, Woody Allen, Tim Burton, Guilhermo Del Toro, todos foram de pouco público, tornaram-se cult e hoje estão ai com seguidores digitais e repercussão imensa. O exemplo mais evidente de todos mesmo foi Monty Python, tamanho público de culto os motivou a criar um canal no YouTube com os jurássicos integrantes.

    Será que realmente querem criar um público tão grande ao redor da música clássica e deixá-la ser vista como “cult”?

  50. Mat,
    Foi dito que a internet trouxe um grande progresso na difusão de obras clássicas que antes eram inacessíveis para o público em geral ,talvez nem mesmo em lojas caríssimas de importados. Sim, o acesso virtual é uma novidade. Mas nisto estamos falando de “enlatados”. Talvez até o consumo de música pelo youtube por indicação de bons conselheiros etc,…..seja o que esteja esvaziando um pouco os concertos.
    Foi falado aqui que até na Alemanha há pouca juventude nos espetáculos clássicos. E a tônica desta página é Greg Sandow, que, numa avalanche de artigos ,poderia suscitar imensas considerações. Nos diagnósticos que ele faz, há uma estatística diminuição de eventos eruditos. E não precisamos ser “eruditos de plantão” para perceber a banalização de nossa cultura de massa, dos espet´culos,do gosto da grande maioria das pessoas,do cinema, da literatura, da televisão. Sandow analisa a dificuldade de se sustentar uma orquestra sinfônica, a possibilidade de um repertório de clássicos contemporâneos chegar mais perto de nossa atualidade do que os autores do séc 18 e 19. Discordo disto, porém o assunto de Sandow é o afastamento percentual da juventude em relação a concertos, repertório ,eventos.
    Este foi o tema de meu último comentário, enquanto você, Mat, em seu último, relata as possibilidades otimistas de acesso ,indireto ou virtual, aos grandes mestres. O youtube é uma revolução. Baixar filmes na internet também mudou tudo em termos de acesso a obras raras. Isto não muda a terrível banalização do cinema comercial apresentado em nossas salas. São assuntos diferentes . A questão de mercado, retorno a curto prazo versus cultura subsidiada de longo prazo está noutro terreno que não a internet.
    Os comentários acima se foram desenvolvendo por desdobramentos de outros comentários. Apenas em meu último, eu me ative a G.Sandow depois de lê-lo. Abraço.

  51. ….simplesmente o povo brasileiro desconhece não só a música erudita como também a popular de alto nível….quem não conhece não pode gostar, é óbvio, afinal se algum de nós músicos, salvo raríssimas exceções entrarmos em uma conversa de arquitetos vamos nos sentir completamente deslocados tendo em vista que não conhecemos a linguagem utilizado por eles….mas ressalto que quando estou de “folga” bebendo uma gelada no bar e executo algumas músicas tanto populares quanto eruditas no violão (…Paulinho Nogueira, Dilermando Reis, Villa Lobos, Augustin Barrios, Isaac Albeniz, etc.) as pessoas, mesmo sendo portadores de uma ignorância musical tamanha gostam e se interessam bastante , até mesmo porque dificilmente se tem acesso às apresentações técnicas instrumentais necessárias para as execuções, ou seja eles admiram……depois que se conhece uma boa música não tem porque regredir, basta conhecer…..
    …enfim, o povo simplesmente não gosta de musica erudita porque não conhece, mesmo com o advento da internet, afinal não se pode ter vontade de procurar aquilo que não se conhece…..

  52. Tenho visto comentários de ambos, mas, sou admirador por espirito da música clássica,erudita e contemporânea, ressalvo-lhe que ouço também o rock, mas, trocar-lhe por clássica, nunca. Conheci recentemente o blog ao qual escrevo e estou admirando-o.
    Sou um Brasileiro admirador por completo da cultura, arte e música Europeia.
    É de se esperar que poucos Brasileiros conheçam ou ouçam, mas, encata-nos que na Euros presevem com veemencia sua cultura, historia, arte e música, sabido que dominados por músicas atuais.

  53. Acredito que a musica classica nao toca ninguem pq realmente como no primeiro comentário, as pessoas acham graça, acham coisa de maluco, e quem jovem que nem sabe o que quer da vida iria se opor a isso? É muito dificil, eu ja fui jovem e ja tentei me “arriscar” em ouvir, mas mostrar para outra pessoa é total estupidez, sempre senti isso e é a realidade. Mas hj tenho 27 anos e percebi que nao adianta colocar a musica ali e dizer “ouve aí” talvez precise de um estimulo, nao dizem que a propaganda é a alma do negocio? Pois entao, eu me interessei por musica classica de verdade depois de assistir um anime chamado shigatsu, e penso que pode ser até um grande negocio mas tudo depende de como é mostrado que se transmite e como é aceita.

  54. Acho fundamental essa conversa sobre música clássica. E concordo com alguém aí que escreveu que a música clássica (prefiro chamar de erudita) jamais vai morrer, apesar de ter um público restrito, minoritário, em relação a outros gêneros musicais. Eu, por exemplo, até 2006, gostava de MPB, samba tradicional, à la Paulinho da Viola, e raramente ouvia música clássica. Até que ouví uma coletânea de J S Bach. O impacto foi mediato. Passei a gostar da música de Bach – que prefiro chamar de instrumental/erudita – e, por tabela, dos outros Grandes Mestres. E isso pode acontecer com muitas outras pessoas, ora bolas! Fiz um curso de pós-graduação em marketing, anos atrás, em que a monografia constituía-se de um trabalho de Pesquisa de Mercado, com todas as suas etapas, para dimensionar o tamanho do “Público de Música Clássica”, em Belo Horizonte. Essa pesquisa foi encomendada pela Prefeitura de Belo Horizonte, à Fundação João Pinheiro (onde eu estudava) com o objetivo de patrocinar concertos matinais de música clássica (erudita), aos domingos, no Parque Municipal daquela capital mineira, caso a resposta à pesquisa fosse positiva. Essa Pesquisa apontou total aceitação do público belorizontino por esses concertos matinais, que foi implantado ainda naquele ano, 1978, com total sucesso, por um longo período. Terminei o curso, um ano depois tive de sair de BH, prá trabalhar em outro centro, e os concertos continuavam “bombando”, com “lotação máxima” do Parque Municipal. Não fiquei sabendo das razões pelas quais deixaram de ser apresentados. Provavelmente faltou dinheiro na Prefeitura. Mas é certo que teve grande frequência por período longo. Isso mostra que a população em geral gosta, sim, desse gênero de música. O que falta, na verdade, é iniciativa como essa do poder público, principalmente, e do privado. O povo gosta, sim, do que é bom e de qualidade. Falta quem o estimule a externar esse bom gosto. E isso em qualquer época. Não se vê incentivo nesse sentido das entidades públicas e privadas. Leio com frequência, na internet (youtube), comentários sobre determinada peça musical clássica, então executada, e me surpreende a quantidade de jovens brasileiros e até adolescentes se declarando amante desse gênero de música, sendo até “marcados” na escola, por causa disso. Portanto, sou super otimista, em relação ao futuro da música erudita (clássica). Na minha opinião, não vai morrer nunca!

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